Médicos defendem ‘chip da beleza’ e criticam ‘prescrição equivocada’
Método foi criado pelo cientista baiano Elsimar Coutinho, inicialmente para tratar doenças como endometriose e miomatose

A proibição implantes hormonais manipulados, também conhecidos como ‘chips da beleza, provocou reações intensas entre especialistas da área de saúde. A medida foi tomada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que suspendeu a manipulação, comercialização, propaganda e uso do produto em outubro.
Trata-se de um implante de gestrinona, hormônio sintético criado há cerca de 40 anos pelo ginecologista e cientista baiano Elsimar Coutinho. Inicialmente desenvolvido para tratar doenças associadas ao ciclo menstrual e auxiliar na contracepção, o implante é recomendado para condições como endometriose, fluxo menstrual excessivo, menopausa, miomas e tensão pré-menstrual (TPM).
Com o tempo, modelos e influenciadoras começaram a utilizar a gestrinona para fins estéticos, promovendo o produto como ferramenta de emagrecimento, o que resultou em sua popularização. Apesar da denominação ‘chip da beleza’, não se trata de um chip real, mas sim de um dispositivo implantável de silicone que libera continuamente gestrinona e, em alguns casos, outros hormônios na corrente sanguínea.
O procedimento é realizado sob anestesia local e, após um período que varia entre seis meses e um ano, o implante deve ser substituído. A gestrinona age no organismo ao se ligar a proteínas em células musculares e cutâneas, favorecendo o ganho de massa muscular e a queima de gordura, resultando em uma melhora na forma física da paciente.
A Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) alerta que não existem estudos suficientes que comprovem a segurança e eficácia do implante de gestrinona. Os efeitos colaterais potenciais incluem acne, aumento da oleosidade da pele, queda de cabelo, aumento de pelos corporais, mudanças na voz e crescimento do clitóris.
Além disso, a SBEM não admite o ‘chip da beleza’ como tratamento para doenças hormonais. A Anvisa também não reconhece nenhum implante de gestrinona com registro sanitário válido no Brasil, o que gera incertezas sobre sua segurança e eficácia.

‘Decisão surreal’
A ginecologista Consuelo Callizo, diretora-médica do Grupo Elsimar Coutinho, aponta que a Anvisa não embasou sua ação em dados científicos robustos e ignorou as publicações existentes que comprovam a eficácia dos implantes hormonais. Ela frisou que a proibição ocorreu devido ao mau uso, o que prejudica pacientes que precisam e médicos que agem de forma ética.
“Existem muitos pacientes que necessitam. Por causa de algumas pessoas, médicos que talvez não fizeram tão bem, não fizeram corretamente, ou por uma irresponsabilidade, ou porque não fizeram um curso suficiente, não se pode simplesmente retirar algo do mercado que faz tão bem há 50 anos, ou mais, porque não foram atrás desses médicos. Se tem alguém fazendo errado, é porque o método está errado ou porque a pessoa está fazendo errado?”, questiona ela durante entrevista ao Portal M!.
Às suas pacientes que já usam o implante, ela orienta que continuem com ele. Para as que precisam trocar, a recomendação é adotar outro método, ao menos por enquanto. Consuelo diz não acreditar que a decisão será mantida.
“Não tem sentido científico nenhum. Então, como a gente consegue mostrar como faz bem às pacientes, não é possível que não haja um pouco de bom senso no sentido de liberação desse método”, reforça a médica, que enaltece a busca por controle e regulamentação, mas sugere que isso deve ser feito com base em estudos.
“Nós somos o país que mais faz cirurgia plástica. Existe algum controle porque tem pessoas que fazem 20? Proibiram a cirurgia plástica porque houve mortes por cirurgia estética? Quem ganha com isso? Por que isso?”, questiona.
Consuelo explica que os resultados positivos do implante são importantes. “Existem pacientes que necessitam desse método, que dependem desse método, que não conseguem ter uma absorção tão boa e uma liberação tão estável com outros métodos, e elas precisam disso. Existem, inclusive, pacientes que misturam vários métodos para conseguir tratar a endometriose, parar um sangramento, para tirar os fogachos, os calores, sem fazer doses extremamente elevadas. Tudo isso mostra como vai ser um impacto extremamente negativo [a proibição]. Tem pacientes desesperadas. Eu acho que é de bom tom que se repense realmente”, pondera.
Benefícios à saúde da mulher
O ginecologista Malcolm Montgomery, coordenador do Programa Comunitário em Saúde Sexual e Reprodutiva da Mulher pela Sociedade Brasileira de Reprodução Humana, também manifestou sua preocupação, ressaltando que a suspensão dos implantes hormonais desconsidera os benefícios que oferecem no tratamento de condições como ovário policístico, cólicas e menopausa. Ele explica que o erro começa com a denominação de ‘chip da beleza’.
“Ele é um tratamento sério e estruturado com hormônios, que, quando usado corretamente e sob orientação médica, oferece suporte terapêutico essencial para a saúde feminina. A banalização desse recurso pode prejudicar sua credibilidade e a segurança de quem realmente precisa dele”, pontua Montgomery.
O médico explica que os implantes subcutâneos são confeccionados com material silástico [de consistência semelhante à borracha], o que permite sua remoção segura caso a paciente não se adapte, proporcionando flexibilidade e segurança.
“Diferente dos implantes absorvíveis, que não podem ser retirados após a inserção, os silásticos permitem ajustes ao longo do tratamento. Por essa razão, desde a década de 1990, minha experiência clínica é exclusivamente com implantes silásticos, com resultados consistentes de êxito e bem-estar para minhas pacientes”, reforça.
O médico alerta que tão importante quanto prevenir práticas inadequadas é reconhecer o valor terapêutico dos implantes hormonais, quando administrados com responsabilidade e critério profissional.
“Deixo aqui meu depoimento como médico ginecologista, comprometido com o bem-estar feminino. É fundamental que pacientes e profissionais de saúde tenham acesso seguro a tratamentos eficazes e regulamentados, e que decisões regulatórias sejam tomadas com equilíbrio entre proteção e benefícios clínicos”, afirma.

Prescrição equivocada: o real problema
O ginecologista Walter Pace, mestre em Reprodução Humana pela Universidade de Paris, com doutorado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, atua na especialidade da endocrinologia ginecológica e reprodutiva há mais de 40 anos, dos quais mais de 25 com prescrição de terapia hormonal por meio dos implantes subcutâneos.
Ao saber da proibição da Anvisa, ele disse que ficou surpreso e indignado. Para Pace, este é mais um ataque de sociedades de especialidades médicas brasileiras sobre os resultados clínicos desse tratamento que, segundo ele, ao longo dos últimos 60 anos, tem se mostrado eficaz na anticoncepção, no controle e tratamento de doenças hormônio dependentes, como endometriose e miomatose, além dos desequilíbrios hormonais, como ocorre na menopausa.
Ele sugere que a Anvisa apelou para casos que deram errado para impulsionar uma campanha de desinformação pública, que, em sua opinião, visa influenciar as mulheres, os médicos e as autoridades para inibir o uso de implantes subcutâneos como via de administração hormonal.
“Esquecem que todas as vias de administração disponíveis (oral, sublingual, injetável, dermatológica, nasal, oftálmica, retal, entre outras) apresentam graus de risco e de contraindicações/efeitos colaterais para a saúde humana, principalmente quando usadas sem o devido cuidado e responsabilidade, por profissionais não qualificados ou por ‘aventureiros'”, alerta.
Walter Pace frisa que a pesquisa desenvolvida por Elsimar Coutinho, responsável pelos primeiros estudos e publicações científicas sobre o assunto, inclusive em revistas médicas mundiais, é ponto inequívoco da eficácia desse procedimento.
O médico lembra ainda que a própria Anvisa, ao atualizar a Portaria SUS/MS nº 334 de 12/05/1998, inclui a gestrinona na lista C5 e ratifica o caráter oficial desse hormônio junto à agência. Além disso, o Conselho Federal de Medicina, por meio da Resolução CFM Nº 2.333, de 30/03/2023, ratifica a Resolução CFM nº 1999, de 2012, ao definir que a administração externa de substâncias que são ou deveriam ser produzidas pelas glândulas do organismo atende a requisitos bem estabelecidos.
“Não são os hormônios que fazem mal, mas a sua prescrição equivocada ou excessiva no organismo. No meio desse turbilhão de argumentos que visam a desinformação, há um aspecto bastante claro: a tentativa incessante de desacreditar um tratamento médico que oferece atendimento personalizado para mulheres, o que está em consonância com o presente e o futuro da Medicina, quando o foco será o atendimento das necessidades de cada indivíduo”, ressalta o profissional.
O que disse a Anvisa
Em comunicado, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informou que tomou a decisão a partir de denúncias apresentadas por entidades médicas, entre elas a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo). Segundo o órgão, foi apontado um crescimento do atendimento de pacientes com problemas devido ao uso de implantes que misturam diversos hormônios, em formato implantável, inclusive de substâncias que não possuem avaliação de segurança para essa forma de uso.
A Anvisa disse ainda que sua área de monitoramento publicou um alerta em que destaca que implantes hormonais para fins estéticos e de desempenho podem ser prejudiciais à saúde, além de não haver comprovação da sua segurança e eficácia para essas finalidades. O ‘chip da beleza’ tem sido manipulado por farmácias magistrais para fins estéticos, tratamento de fadiga ou cansaço e sintomas da menopausa.
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