Por que os outros não entendem a minha dor?

Seja emocional ou física, é uma experiência única; por mais que duas pessoas passem por mesmas situações, cada uma sente de um jeito


Sergio Manzione
Sergio Manzione 22/02/2025 16:11 • Artigos
Por que os outros não entendem a minha dor? - Divulgação

Por que sua dor parece invisível para os outros? O que impede as pessoas de realmente entenderem o que você sente? Quantas vezes você já tentou explicar o que sente e recebeu uma resposta vazia, um conselho pronto ou, pior, um silêncio desconfortável? Pode ser exaustivo. Você grita por dentro, mas o mundo segue como se nada estivesse acontecendo. Por que os outros não entendem a minha dor?

A dor é única para cada um

A dor, seja emocional ou física, é uma experiência única. Por mais que duas pessoas passem por situações semelhantes, cada uma sente de um jeito. Carl Gustav Jung (1875–1961) dizia que “cada um de nós tem sua própria dor para carregar, e só quem a carrega pode compreender seu peso”. A neurociência comprova isso. Um estudo publicado em 2011 na Proceedings of the National Academy of Sciences demonstrou que a dor emocional ativa as mesmas regiões cerebrais da dor física, como o córtex cingulado anterior e a ínsula. Isso explica por que ser ignorado ou não compreendido pode ser tão angustiante quanto uma lesão real.

Além disso, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 970 milhões de pessoas no mundo sofrem com transtornos mentais, mas a maioria não busca ajuda justamente pelo medo da incompreensão e do julgamento social. Se alguém nunca experimentou a sua dor, pode acabar racionalizando, minimizando ou até mudando de assunto. Não porque não se importa, mas porque simplesmente não sabe como acessar essa realidade.

O medo da dor do outro

Nem sempre a falta de compreensão vem da insensibilidade. Em muitos casos, o problema não é a ausência de empatia, mas o medo. Elisabeth Kübler-Ross (1926–2004), conhecida por seu trabalho sobre o luto, afirmava que a sociedade moderna ensina a evitar a dor, em vez de aceitá-la como parte da vida. Muitas pessoas fogem do sofrimento alheio, porque ele desperta suas próprias dores reprimidas. Ao ver alguém sofrendo, algumas pessoas sentem angústia e preferem se afastar. Outras podem reagir com impaciência, porque a dor do outro as obriga a encarar questões internas que não querem enfrentar. É por isso que, em muitos casos, quando buscamos acolhimento, recebemos frieza.

A ilusão do “eu faria diferente”

Outro motivo pelo qual os outros não entendem sua dor é a tendência humana de comparar. “Se fosse comigo, eu agiria assim”, “Você precisa superar”. Daniel Kahneman (1934–2024), psicólogo vencedor do Prêmio Nobel, descreve em Rápido e Devagar que nosso cérebro simplifica a realidade e acredita que temos mais controle do que realmente temos. Isso explica por que tantas pessoas acham que a dor pode ser evitada com “mais força de vontade”.

É como olhar um incêndio de longe e dizer que daria conta de apagar as chamas sem sequer sentir o calor. Mas a verdade é que ninguém sabe como reagiria até viver a situação. A dor só pode ser compreendida quando é sentida, e, ainda assim, de maneira única para cada um.

O culto à positividade e a pressa em resolver o problema

Vivemos em uma sociedade que valoriza a produtividade e a positividade extrema. A psicóloga Barbara Ehrenreich (1941–2022), no livro Bright-Sided, critica a ideia de que “pensar positivo” resolve tudo, mostrando como essa mentalidade leva à negação do sofrimento real.

Quando alguém expressa dor, a reação comum é tentar “consertar” o problema rapidamente. “Vai passar”, “Pensa pelo lado bom”, “Já tentou se distrair?” são frases ditas com boa intenção, mas que muitas vezes não acolhem, apenas encerram a conversa. O que a maioria das pessoas não percebe é que quem sofre não quer soluções prontas, mas quer ser ouvido. Quer que sua dor seja reconhecida. Quer sentir que não está sozinho.

E agora? Como lidar com essa incompreensão?

Saber que sua dor pode não ser entendida é doloroso, mas há algumas formas de lidar com isso:

  • Busque quem pode te ouvir de verdade – Nem todo mundo tem a sensibilidade para acolher, mas algumas pessoas têm. Terapia, grupos de apoio ou até aquele amigo que sabe escutar podem fazer a diferença. Estudos mostram que o suporte social reduz os níveis de cortisol, um dos hormônios do estresse.
  • Não se culpe por sentir – Segundo Carl Rogers (1902–1987), a aceitação é o primeiro passo para a mudança genuína. Permitir-se sentir é parte do processo.
  • Aprenda a colocar limites – Se alguém sempre minimiza sua dor, talvez seja melhor evitar compartilhar com essa pessoa. Nem todo mundo merece acesso ao seu lado mais vulnerável.
  • Dê tempo ao tempo – Segundo a American Psychological Association (APA), o luto e outras dores emocionais não têm um cronômetro fixo. Cada um tem seu tempo para elaborar suas emoções.

A importância da comunicação emocional

Se a dor é subjetiva, será que há uma forma melhor de comunicá-la? Muitas vezes, o problema não está apenas na falta de empatia dos outros, mas na maneira como expressamos o que sentimos.

A comunicação emocional pode ser um caminho para tornar a dor mais compreensível. Em vez de exigir que o outro faça algo, podemos expressar como nos sentimos quando algo acontece.

Por exemplo:

  • Em vez de dizer “Você nunca me escuta!”, tente “Me sinto invisível quando tento falar e não sou ouvido.”
  • Em vez de “Você não se importa comigo.”, tente “Me sinto sozinho quando você não pergunta como estou.”

Marshall Rosenberg (1934–2015), psicólogo e criador da Comunicação Não Violenta (CNV), explica que quando usamos exigências, o outro pode se sentir atacado e reagir defensivamente. No entanto, quando falamos sobre nossos sentimentos, há mais chances de sermos realmente escutados.

Ao expressarmos nossa dor de maneira emocional e não apenas racional, não estamos tentando convencer o outro a sentir o mesmo que nós, mas sim permitir que ele veja o impacto do que acontece. Isso abre espaço para diálogos mais humanos e acolhedores.

Quando buscar ajuda profissional?

Se sua dor tem sido difícil de suportar e persiste por muito tempo, é fundamental procurar um profissional. Às vezes, não damos conta sozinhos de tantas coisas, com o bombardeio de desafios da vida, e, por isso, vamos buscar a ajuda de um psicólogo.

O sofrimento prolongado pode estar relacionado a questões mais profundas, e identificar suas causas é essencial para um tratamento adequado. A psicoterapia oferece um espaço seguro para compreender melhor as próprias emoções, e aprender a lidar com elas de forma mais saudável.

O que realmente importa

Viktor Frankl (1905–1997), psiquiatra e sobrevivente do Holocausto, escreveu: “Quando não podemos mais mudar uma situação, somos desafiados a mudar a nós mesmos.” Se ninguém entende, talvez o caminho seja parar de buscar essa compreensão no outro e começar a buscá-la em si mesmo. Mas isso não significa isolar-se. Significa aprender a comunicar o que sentimos de forma autêntica, abrindo portas para relações mais empáticas. 

Porque, no fim das contas, a dor pode até ser solitária, mas não precisa ser silenciosa.

Sergio Manzione é psicólogo clínico, administrador, podcaster, colunista sobre comportamento humano e psicologia no Portal Muita Informação!, e escreveu o livro “Viva Sem Ansiedade – oito caminhos para uma vida feliz”. @psicomanzione

Sérgio Manzione

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