Especialista alerta sobre movimento antivacina e condena prática entre médicos: "É absolutamente abominável"

Convidado do podcast do M!, Raymundo Paraná endossa posição da OMS, que incluiu a prática em seu relatório anual como um dos dez maiores desafios da saúde 

Por Nicolas Melo
07/05/2022 às 15h00
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Foto: Divulgação
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Sempre que uma nova doença surge, os movimentos antivacina se fortalecem. A prática ocorre desde as epidemias de varíola na Idade Média até a mais recentemente emergência sanitária do planeta, a pandemia de Covid-19. Para o médico assessor da Câmara Técnica em Hepatites Virais da Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab) e do Ministério da Saúde, o hepatologista Raymundo Paraná, a prática é abominável. 

"Essa campanha antivacina é absolutamente abominável porque ela é perversa e retrata uma ignorância profunda de quem faz esse tipo de campanha", critica Raymundo Paraná, que é também o diretor do Hospital Aliança/Rede D'Or e convidado deste episódio do podcast do Portal M! "Não é possível, na atualidade, se fazer uma campanha antivacina quando a humanidade controlou e extinguiu uma série de doenças devido à vacina. Não faz o menor sentido. Isso não é racional. Isso não é científico", ressaltou.

Recentemente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) alertou o mundo sobre um surto de hepatite aguda grave de causa desconhecida em crianças no Reino Unido, que se espalhou pela Europa e Ásia, e agora chega à América do Sul. Até a última quarta-feira (4), o risco da doença chegar ao Brasil era tido como remoto. Mas até sexta (6), ao menos sete casos suspeitos da infecção - quatro no Rio de Janeiro e três no Paraná -, eram monitorados pelo Ministério da Saúde do Brasil. 

Em 2019, antes da pandemia da Covid-19, a OMS incluiu o movimento antivacina em seu relatório anual como um dos dez maiores desafios da saúde para aquele ano. "A vacinação  é uma das formas mais econômicas de evitar doenças - atualmente previne de 2 a 3 milhões de mortes por ano, e outro 1,5 milhão poderia ser evitado se a cobertura global de vacinações melhorasse", disse a OMS. 

O sarampo, por exemplo, registrou um aumento de 30% nos casos registrados em todo o mundo. "As razões para esse aumento são complexas e nem todos esses casos se devem à hesitação da vacina. No entanto, alguns países que estavam perto de eliminar a doença viram um ressurgimento", publicou a OMS.

No Brasil, a doença já havia sido considerada eliminada, mas com a baixa cobertura vacinal, o país corre risco de viver uma nova epidemia da doença. 

A OMS ainda tentou justificar o retrocesso por conta de dificuldades no acesso a vacinas. Raymundo Paraná, entretanto, vai ainda mais além. Ele é taxativo e duro ao criticar a presença de colegas médicos entre os integrantes do movimento antivacina.

"Isso não é possível. Se for um médico, é um absurdo porque para um médico não lhe é dado o direito à ignorância. Se for um leigo, eu aconselho que estude, que leia e veja a história da vacina na humanidade e como isso mudou a história, como mudou a expectativa de vida de populações e, inclusive, da população brasileira que viveu antes da década de 80, antes do Sistema Único de Saúde (SUS), que presenciou muitas mortes de crianças por conta de difteria, sarampo, catapora, paralisia infantil (poliomelite)", destacou.

"Hoje um estudante de Medicina sequer conhece essas doenças. Por quê? Por causa da vacinação! Então, não faz sentido ninguém reverberar uma campanha contra a vacinação. E se for um médico, é absolutamente reprovável", criticou. 

Para o hepatologista, o Brasil deveria ter órgãos para fiscalizar tais atitudes, principalmente se partirem de profissionais da área de saúde.

"Existe muita documentação científica farta e não foi dado direito de passar informações falsas a ninguém, muito menos na área da saúde. Uma informação dessas saíndo de um profissional da área da saúde é de uma perversidade atroz. Isso pode induzir pacientes a morte, como já ocorreu", ressaltou. 

Paraná ainda falou sobre casos de profissionais que induziram pacientes a realizar o tratamento da Covid-19 em casa e que, após piora do quadro respiratório, chegaram tarde demais na unidade de saúde, evoluindo à morte.

"Alguém precisa responder por isso! Claro que precisa! Tem que responder por isso e acho que os nossos órgãos de classe têm mecanismos para identificar e fazer com que essas pessoas respondam, quando elas atuam desta maneira", afirmou. "Felizmente, é uma minoria. A maioria (dos médicos) não é assim, tem um compromisso com a humanidade e com a ciência", ponderou. 

 

Confira a íntegra do podcast:

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