Salvador na contramão da progressividade do IPTU

IPTU pode ser progressivo em razão do valor do imóvel; e ter alíquotas diferentes de acordo com a localização e o uso do imóvel

Por Karla Borges*
19/03/2024 às 13h02
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Foto: Divulgação
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Desde a emenda constitucional EC 29 de 13 de setembro de 2000, o IPTU pode ser progressivo em razão do valor do imóvel; e ter alíquotas diferentes de acordo com a localização e o uso do imóvel. Todavia, a progressividade prevista pela legislação de Salvador é incongruente e não obedece às premissas constitucionais, ao impor alíquotas exatamente iguais para imóveis acima de R$ 472.317,64 e, também, ao conceder tratamento privilegiado aos grandes terrenos da cidade.

A progressividade consiste na atribuição de alíquotas maiores, conforme se aumenta o valor venal do imóvel. Elas, podem, também, ser diferenciadas em virtude da localização e uso do bem. Há, ainda, previsão constitucional para a progressividade no tempo se a propriedade urbana não cumprir a sua função social, permitindo a imputação de percentuais cada vez maiores, como medida corretiva aos proprietários do solo urbano não edificado, quando não é dada a utilização adequada aoespaço.

A Lei 9.767/23, de Salvador, em vez de estabelecer um IPTU progressivo aos terrenos como forma de intervir no ordenamento urbano e exigir o que determina a Constituição Federal, resolveu permitir que terrenos sem construção ou com área excedente acima de 2.000,00 m², pudessem pagar 80% dos seus débitos com Transcon e compensar os 20% restantes com créditos, alternativas não concedidas aoutros imóveis da cidade, como os residenciais, comerciais, industriais ou de serviços.

Essa progressividade tem caráter extrafiscal e serve para induzir os proprietários a darem o devido cumprimento à função social da propriedade. Ou seja, quem menos precisa foi mais beneficiado pela Prefeitura de Salvador. O mandamento constitucional busca evitar a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não utilização. Preocupa-se, sobretudo, com a deterioração das áreas urbanizadas, com a intenção de fomentar um pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana.

A Carta Magna, portanto, impõe o IPTU progressivo no tempo, com majoração da alíquota pelo prazo de cinco anos consecutivos, caso haja descumprimento de um dever relacionado aos proprietários de imóveis, qual seja, a não destinação do seu bem ao cumprimento da sua função social tal como delineada no plano diretor municipal. Caso o proprietário permaneça sem cumprir a obrigação, o imóvel segue para desapropriação.

A realidade é que a gestão municipal soteropolitana em vez de atenderaos ditames constitucionais, concedeu tratamento diferenciado a quem deveria ter sofrido punição severa, afinal vários municípios brasileiros vedam a concessão de anistias, incentivos ou benefícios fiscais relativos ao IPTU progressivo e suspendem quaisquer isenções incidentes sobre o imóvel quando o proprietário tem ciência da necessidade de edificar e não o faz. Salvador, como sempre, na contramão da progressividade do IPTU,em um dos raros casos em que se permite a intervenção do poder público na propriedade privada.

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* Karla Borges é professora de Direito Tributário

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