O que sua orelha diria a você aos 92 anos?
Bora ouvir sobre isso?
Ela chega lá?
Junto com você?
Apesar de você?
Vai que cola em outro humano?
Tem disso na medicina.
Há dias ou semanas que senti coceira no arcabouço de ouvir, o nobre pavilhão auditivo
Não era urticária daquelas que remédio passa.
Foi um prurido na mente de quem tem que falar mais e por o dedo, a mão e a caneta na ferida
Ela põe haste de óculos, lápis, elástico de máscara, áudio fone, brinco ou argola e num furo, rompe, vira piercing
Ela freia o cabelo que insiste em acortinar os olhos
A orelha sobrevive, o nariz aponta pra frente, o dente corta vento enquanto segue adiante e os olhos transcrevem letras e pensamentos
Tudo fica velho e faz cera
Mas as ideias não, elas se empoeiram pelo tempo e formam tijolos
Elas não são de carne
É osso, viu?
Ideias são nuvens, vapor, orvalho
Chovem e aquecem
No céu de brigadeiro, sonhos e broas
No céu da boca de gente, da fala
São fluidas, cinzas, cachecóis ou algodões
Ideia é nuvem vista de fora pra dentro
Ideia é nuvem nua que só quem vê acima dela traduz beleza sem ficar flutuando
Bem que a nuvem podia me convidar pra conhecer o seu avesso
Aposto que lá os sentidos dispensam óculos
Lá é macio e silencioso
Um vácuo bom
Orelha aqui deveria ser só cartilagem e pele
Eu só queria ser uma orelha velha e dizer:
“Feliz, 91 anos!”
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*Telmo Moraes Pedreira – cirurgião-dentista, CROBA 6670.
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