Falando para o vento

Por Sergio Manzione
23/01/2023 às 11h56
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Foto: Divulgação
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Sabe aquela situação em que você tem algo importante para falar, mas ninguém ouve?  Ou quando você já está falando e mudam de assunto sem mais nem menos? Será que o problema está com você ou com os outros?

Imagine (ou relembre) a seguinte situação: você com uns amigos (as) conversando tranquilamente em um lugar sossegado. Tem alguém que fala muito, alguém que só escuta, outro que faz as piadas, e assim a conversa vai indo em frente. Daí você resolve falar alguma importante e começa o assunto, mas, de repente, alguém atravessa sua conversa para dizer como o tempo está quente, ou como é bonito o rapaz da outra mesa. Resultado, você fica falando sozinho(a), e o seu assunto importante, não tem nenhuma importância para o grupo. Afinal, o que houve?  Por que deixaram você ficar falando para o vento?  Não há a resposta única, pois várias são as possibilidades.  

No entanto, qualquer seja a resposta, o que você estava falando não é algo que seja do interesse daquelas pessoas. O grupo falava de viagens e você quis falar dos desastres ocasionados pela chuva?  Quando você fala soa como arrogante e pretensioso?  O grupo não tem repertório para entender o seu assunto? Por exemplo, você quis falar sobre o Dodecafonismo de Schöenberg para quem cultua sertanejo e pagode?  Ou fez ao contrário?  Outra hipótese é de que as pessoas desse grupo só estão interessadas em falar sobre elas mesmas, e, com a educação doméstica ausente, nem se dão ao trabalho de ouvir.  Seu assunto, ainda, podia ser mais interessante do que o da figura que quer monopolizar o grupo, e ela vai sabotar sua fala pela necessidade egoística de chamar a atenção.

Seja como for, há uma dissonância entre os seus interesses e repertórios, e os do grupo. Além desse descompasso, outros elementos podem se somar como, por exemplo, a falta de educação básica, o ciúmes por você estar chamando mais a atenção do que os outros, ou, ainda, seu assunto ter uma profundidade muito maior do que a rasa ignorância vigente. Enfim, é hora de pensar o que você estava fazendo lá nesse encontro. Foi levado por alguém? É a primeira vez que conversa com aquelas pessoas? Você é arrogante mesmo e se torna a pessoa chata que ninguém quer ouvir? Não é nada disso? Então é o quê? Quando o grupo muda de assunto no meio da sua fala sem sequer pedir licença, ele o(a) está rejeitando.

No entanto, ser rejeitado(a) por um grupo não quer dizer que o problema é você, pois essa é a primeira coisa que passa na cabeça de quem é posto de lado. Pense na situação hipotética em que um grupo de funcionários públicos resolve fraudar uma licitação. Eles combinaram tudo direitinho, mas não quiseram que você participasse, pois o(a) consideram "legalista".  De fato, o grupo "virou a cara" para você, mas, pense, ser rejeitado(a) por um grupo de ladrões não acaba sendo um atestado de idoneidade?  Então, nem sempre ficar de fora é algo ruim.  Voltemos para o grupo de conversa, que atravessou a sua fala: será que você está no lugar certo? Esse pessoal tem condições de entender o que você quer falar e vice-versa, ou você mostra, sem querer, a ignorância alheia ao encarar assuntos com mais profundidade?

Nos dias atuais, os assuntos são rasos, as redes socias querem tudo muito resumido para você não perder tempo lendo e se instruindo, o que o(a) afastará das milhares de ofertas para lhe empurrar alguma venda. Ou você acha que redes sociais servem para quê?  Assim, essa aceleração dada por mensagens instantâneas e redes sociais, faz com que as pessoas transportem esse comportamento para as conversas "ao vivo", e, consequentemente, o próximo assunto interessa mais do que o atual. Nas redes sociais, o assunto não importa muito, mas, sim, o número de pessoas interessadas nele, assim as empresas poderão mapear seus hábitos de consumo e oferecer, então, um produto "adequado" ao seu perfil.

Portanto, não se aborreça quando você ficar falando para o vento, ou para as paredes, pois as pessoas falam sobre todos os assuntos, mas, infelizmente, com pouquíssima profundidade. Isso também dá espaço para as "fake-news", pois muitos perderam (ou não tem) o senso crítico básico de verificar de onde vem a informação, pois, afinal, "não dá tempo".

Quanto mais rasas forem as conversas, mais egoístas as pessoas se tornarão, mais ignorantes permanecerão, e vão desprezar quem tem o conhecimento, que passa a ser o diferente, e candidato a ser expurgado do grupo. Você lembra da historinha do "patinho feio"?  Será que você é o "patinho(a)"...  Parabéns por ler até aqui, pois muitos não passaram nem do título, que não tem nenhum apelo, nem "dancinha" do autor.

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Sergio Manzione é psicólogo clínico, administrador, mentor, podcaster, colunista sobre comportamento humano e psicologia no Portal Muita Informação!, e escreveu o livro "Viva Sem Ansiedade - oito caminhos para uma vida feliz". @psicomanzione

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