Saída verde para o Brasil e a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais

Por Thiago Suaid e Marcela Pitombo
19/04/2022 às 15h10
  • Compartilhe
Foto: Acervo pessoal
Foto: Acervo pessoal

Em janeiro deste ano a Lei nº 14.119/2021 que instituiu a Política Nacional de Pagamentos por Serviços ambientais (PNPSA) completou um ano de vigência no ordenamento jurídico brasileiro. Embora recente, a legislação já desponta no cenário nacional, com o advento de novos programas e projetos voltados para o fomento do mercado de serviços ambientais no Brasil, em sinergia com a indispensável agenda global ESG.  

Em contexto histórico, as primeiras iniciativas de pagamento por serviços ambientais surgiram na década de 1930, lastreadas em conservação de solo e recursos hídricos em áreas de lavoura nos Estados Unidos, e atualmente é conduzida pela Farm Service Agency (FSA), através de ações como o Conservation Reserve Program do Departamento de Agricultura Americano.

A partir do final dos anos 90 na América Latina, programas de pagamentos por serviços ambientais começaram a ser normatizados e implementados em países como Costa Rica e México. No Brasil, a primeira previsão legal no âmbito nacional foi positivada apenas em 2012, por meio do art. 41 do Código Florestal Brasileiro (Lei nº 12.651/2012), até a publicação da Lei federal de PNPSA em 2021, impulsionando as iniciativas e projetos de programas oferecidos pelos entes federados.

Vale dizer que a mencionada legislação define conceitos, objetivos, diretrizes, ações e critérios de implantação da PNPSA - sob o escopo de orientar a atuação do poder público, das organizações da sociedade civil e dos agentes privados, de forma a manter, recuperar ou melhorar os serviços ecossistêmicos em todo o território nacional - além de instituir o Cadastro Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (CNPSA) e o Programa Federal de Pagamento por Serviços Ambientais (PFPSA).

Assim, extrai-se o conceito legal de PSA, como a transação de natureza voluntária, da qual um pagador de serviços ambientais transfere a um provedor desses serviços, recursos financeiros ou outra forma de remuneração, nas condições acertadas.

O instrumento segue a lógica preventiva e promocional, ao instituir incentivos e premiações, de cunho monetário ou não, para quem preserva, prestigiando os princípios do provedor-recebedor e usuário-pagador.

Entre as modalidades de serviços ambientais elencadas em rol não exaustivo pela lei federal, estão: Green bonds (títulos verdes); Cota de Reserva Ambiental (CRA); prestação de melhorias sociais a comunidades rurais e urbanas; sem prejuízo do reconhecimento de outras modalidades a serem estabelecidas por atos normativos de órgão competente, bem como pactuadas previamente entre pagadores e provedores.  
Em 2020 foram criados os programas Floresta + e Floresta + Carbono, através das Portarias nº 288 e 518/2020, com o intuito de viabilizar um mercado favorável e efetivo de serviços ambientais em áreas mantidas com cobertura de vegetação nativa, além de estabelecer diretrizes de fomento ao mercado voluntário de créditos de carbono, com a proposta de reconhecer, beneficiar e remunerar àquele que contribui com a manutenção e aumento dos estoques de carbono florestal.

Na mesma linha, o Ministério do Meio Ambiente lançou na ultima semana o Programa Nacional de Redução de Metano de Resíduos Orgânicos - Metano Zero, amparado pela Lei federal nº 14.119/2021 que institui a Política Nacional do Pagamento por Serviços Ambientais, criando mecanismos de incentivos e premiações, de cunho monetário ou não, para compensar atividades individuais ou coletivas que favorecem a manutenção, a recuperação ou a melhoria dos serviços ecossistêmicos.

O objeto do programa está no aproveitamento energético e com combustível de resíduos ou produtos orgânicos como fontes de biogás e biometano. Aqui, o destaque está nos resíduos sólidos urbanos e agrícolas, provenientes, por exemplo de aterros sanitários, produção de cana-de-açúcar, suinocultura, criação de aves, indústria de laticínios, entre outros.
A expectativa é de que o Brasil tem a explorar, uma espécie de Pré-Sal Verde, com capacidade estimada de aproveitar 120 milhões de biometano por dia, originada por completo de resíduos orgânicos, um volume maior que a produção diária de gás do Pré-Sal, ou 4 vezes maior que a capacidade do gasoduto Brasil-Bolívia.

Outro destaque está nas iniciativas oferecidas pelos bancos, a exemplo das chamadas públicas lançadas pelo BNDES. A primeira para o desenvolvimento do Floresta Viva, cujo intuito é executar projetos de restauração ecológica: formação de corredores ecológicos e recuperação de bacias hidrográficas, de áreas em todo o território nacional. A meta de investimento é de R$ 500 milhões ao longo de 7 anos, com até 50% de recursos do BNDES.

A segunda chama pública, tem como objeto inédito a compra de créditos de carbono para aquisição de até R$ 10 milhões desses certificados de sequestro ou redução de gases do efeito estufa por empresas ou projetos ambientais. A expectativa é envolver chamadas de R$ 100 milhões a R$ 300 milhões nos próximos dois anos. Os créditos visados pelo BNDES são exclusivamente do mercado voluntário, que globalmente já ultrapassou US$ 1 bilhão em ativos em 2021 e, no Brasil, deve ganhar força com projetos voltados à preservação de biomas, reflorestamento e serviços ecossistêmicos congêneres. 

Não há dúvidas sobre o potencial do PSA, que se exercido de forma relevante, contribuirá substancialmente para a melhoria dos benefícios ecossistêmicos gerados pela natureza, incluindo o aumento e manutenção dos estoques de carbono, conservação da biodiversidade, polinização, regulação do clima, observação de fauna, disponibilidade hídrica, ciclagem dos nutrientes, fertilidade e redução da erosão do solo, e apreciação de paisagens cênicas.

Em que pese a vigência da lei competente, que já confere a segurança jurídica necessária para as transações, é necessário avançar com as discussões sobre regulamentação no plano estadual, fomentar outros programas e até mesmo viabilizar a participação do setor privado e organização da sociedade civil para construção cooperativa e sinérgica de projetos envolvendo a temática. 

Para além da conjuntura econômica, política e social, a pauta ambiental assumiu protagonismo na agenda das grandes potencias, e a abertura para projetos de PSA e congêneres evidenciam seu potencial disruptivo e inovador, sendo indispensável a participação do setor privado nesse processo construtivo de efetivação dos objetivos da Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais.
Por isso, o momento é propício para impulsionar de uma vez a economia verde, e a Política Nacional de Pagamentos por Serviços ambientais (PNPSA) pode ser o caminho para uma saída econômica e reputacional positiva, que em sinergia à agenda ESG, deve sedimentar o Brasil como grande player nesse mercado global.

------------------------------------

*Thiago Suaid  é sócio head da área ambiental da MoselloLima Advocacia.
*Marcela Pitombo é coordenadora de PSA, Créditos de Carbono e Negócios Verdes da MoselloLima Advocacia. Certificação em U.S. Public Policy: Social, Economic, and Foreign Policies pela Harvard University/HarvardX.

-------------

O conteúdo dos artigos é de responsabilidade dos respectivos autores, não representanto, portanto, a opinião do Portal Muita Informação!