Como identificar e conter as crises que acometem crianças e adolescentes autistas

Neste Abril Azul, o podcast do Portal M! recebeu a psicóloga Patrícia Serra, especialista em análise do comportamento aplicada para autismo e deficiência intelectual

Por Bruna Ferraz
13/04/2024 às 08h20
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Foto: Arquivo pessoal
Foto: Arquivo pessoal

No último 2 de abril, foi celebrado o Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo para fomentar a discussão de práticas voltadas à melhoria da qualidade de vida das pessoas que estão dentro do Transtorno do Espectro Autista (TEA), condição que atualmente atinge cerca de 2 milhões de pessoas no Brasil, o equivalente a um caso confirmado a cada 110 indivíduos.

Ao longo de todo o mês são realizadas atividades do Abril Azul, campanha que visa tratar de forma ainda mais significativa as questões em torno do transtorno, que afeta uma em cada cem crianças no planeta, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS).

Um levantamento do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos mostrou que nos anos 1970, o número de diagnósticos de TEA estava na faixa de 1 para cada 10 mil crianças. Já em 1995, pulou para 1 em cada 1.000 e continuou crescendo de forma acelerada. Em 2018, a taxa chegou a 1 a cada 59 e, em 2023, 1 a cada 36.

Dentre os diversos assuntos relacionados ao TEA, a psicóloga e equoterapeuta Patrícia Serra falou ao podcast do Portal M! sobre um assunto que ainda é tratado como tabu: as chamadas crises das crianças e adolescentes neurodivergentes: do que se trata, como os sinais podem ser identificados e como contê-las.

A profissional é especialista em análise do comportamento aplicada para autismo e deficiência intelectual e em avaliação psicológica. Ela já atuou no Centro de Referência Estadual para Pessoas com TEA e atualmente trabalha como psicóloga clínica com atendimentos voltados para crianças.

Segundo Patrícia, as crises podem vir de várias formas, sendo desencadeadas de maneiras diferentes, a partir de cada pessoa, e podem ser iniciadas por questões sensoriais, tanto externas, quanto internas. A primeira se caracteriza por fatores como o barulho, a multidão, estímulos visuais, texturas específicas e até mesmo temperaturas incômodas, como o frio ou o calor em excesso.

Quanto às questões internas, trata-se da não administração adequada de emoções. "Por exemplo, estar com raiva, ansioso e não conseguir administrar, não conseguir conversar, não conseguir demonstrar, não conseguir lidar com isso, e acaba se desregulando", explica.

A psicóloga destacou que o fundamental, nesses casos, é analisar individualmente cada caso. "A gente desenvolve estratégias em relação à crise dependendo da avaliação que a gente faz de cada indivíduo. [...] Para alguns, quando está em uma crise, o acolhimento do abraço, de apertar, pode ajudar. Mas em outros, o afastamento é muito melhor".

Crise X birra

Patrícia Serra também pontuou que é preciso saber diferenciar uma crise de crianças e adolescentes neurodivergentes das birras. A crise, como a profissional explicou, costuma ser desencadeada por questões sensoriais, externas ou internas, e em alguns casos, pelos dois juntos. Uma birra, no entanto, tem como objetivo principal a conquista de algo mais concreto e específico.

"É uma questão mais de frustração em relação a tentar conseguir algo e não conseguir ter acesso àquilo. A birra cessa assim que a gente dá aquela coisa que a pessoa queria. A crise não - a gente pode até retirar do local e mesmo assim, ela ainda pode continuar. Então, leva um tempo para essa autorregulação".

Crises na adolescência

Os momentos de crise para pessoas do TEA já são naturalmente mais desafiadores. Quando se fala de adolescentes, ou seja, de pessoas já dotadas de força física, a questão se torna, de forma geral, significativamente mais complexa.

"É a dificuldade dessa comunicação, de se expressar, de entender o que está acontecendo e durante a transição da adolescência, existe a transição também de hormônios. Quando chega na adolescência, muitos autistas que têm dificuldade na comunicação acabam demonstrando, se expressando através comportamentos mais violentos, com episódios lesivos, ou até autolesivos".

A adolescência em si, segundo a especialista, já demanda uma atenção mais específica, tratando-se  ou não alguém diagnóstico para o TEA. Quando é um autista, no entanto, os cuidados precisam ser redobrados.

"Podem acabar aparecendo alguns comportamentos disruptivos, como agressividade. Como são maiores, fica um pouco mais difícil. Não necessariamente vai ter um medicamento, mas é interessante buscar um médico para avaliar, para amenizar as questões de humor e, principalmente, continuar o atendimento multidisciplinar. Caso não tenha, iniciar, para trabalhar as questões de emoções, de comunicação, de expressão, de ansiedade e de questões sensoriais", orienta.

Quando é necessário medicar?

Patrícia Serra informou que, quando se tem um diagnóstico para o TEA, uma das primeiras reações das pessoas é buscar um medicamento para acompanhar aquele indivíduo no seu dia a dia. A questão, segundo a especialista, é que não existe um remédio específico para autista, mas sim para amenizar os sintomas associados ou outras comorbidades.

Confira o podcast na íntegra:

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