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Professor Samuel Vida critica banalização do termo “racismo estrutural”

Ao Podcast do Portal M!, ele disse que a banalização gera uma "noção de ausência de responsabilidade dos sujeitos"

No Novembro Negro, mês dedicado à luta do povo preto por igualdade e respeito, marcado também pelo combate à discriminação racial, o Podcast do Portal M! ouviu o advogado e professor de Direito da Universidade Federal da Bahia, Samuel Vida, que falou sobre diversos temas e criticou a banalização do termo “racismo estrutural”.

Além de professor da Ufba, Samuel Vida é coordenador do Programa Direito e Relações Raciais, fundado em 2003, numa iniciativa pioneira entre as faculdades de Direito do Brasil. Também é mestre em Direito, Estado e Constituição pela UnB, doutorando em Direito, Estado e Constituição pela UnB, e atuou ainda como consultor na elaboração do Estatuto da Igualdade Racial, do Estatuto Estadual da Igualdade Racial e Combate à Intolerância Racial e das Diretrizes para a formulação de Estatutos Municipais da Igualdade.

De acordo com o especialista, a crítica à banalização da expressão se dá porque desenvolve uma “noção de ausência de responsabilidade dos sujeitos”. “Eu não a adoto preferencialmente, porque em torno da ideia de racismo estrutural, se desenvolve uma noção de ausência de responsabilidade dos sujeitos. Então, se há uma estrutura que reproduz o racismo, o sujeito não se responsabiliza”, explica.

Por conta deste quadro, o professor indica que o tema do racismo precisa de um esforço de compreensão de todos. Isso porque, segundo ele, cada vez mais, o racismo não se limita às relações individuais. “Ou seja, aqueles episódios em que alguém agride outro, xinga, destrata, etc. O racismo é muito mais abrangente, e envolve um fenômeno político de dominação. Ele se expressa de forma muito plural, em diversos aspectos da vida e da sociedade”.

Análise

Para tanto, o advogado defende a necessidade de uma análise mais profunda sobre o racismo, para que seja possível a construção de estratégias de enfrentamento. “Quando pensamos o racismo apenas no plano individual, a resposta é sempre o direito penal, criminalizar a pessoa que agiu dessa forma ou a educação, imaginando que, por ignorância, desinformação, essa pessoa pode ter assim agido”.

Já quando se pensa o racismo de forma mais complexa, o professor explica que há o entendimento de que o enfrentamento ao racismo precisa de mais elementos, sobretudo, porque ele se faz presente nas instituições, nas posturas culturais do cotidiano e nas políticas públicas.

“Então, ele se apresenta como um fenômeno que organiza a sociedade. A tentativa de qualifica-lo como racismo estrutural é, exatamente, a busca pela caracterização mais adequada, de como o racismo funciona, nesse caso, associado à ideia de uma estrutura, algo que sustenta e permite a reprodução da sociedade”.

Como exemplo do caso, o professor resgatou a fala do secretário de segurança pública da Bahia, Ricardo Mandarino, que reconheceu que houve racismo na morte dos jovens baianos, Bruno Barros da Silva e Yan Barros da Silva no supermercado Atakadão Atakarejo, no dia 26 de abril, em Salvador (BA).

“A fala dele dizia ‘nós sabemos que existe o racismo estrutural na polícia, mas não podemos fazer nada’ ou seja, é algo maior que nossa vontade. Esse modo de conceber o racismo estrutural é profundamente equivocado e transforma num meio de produzir um álibi, que banaliza a própria prática. É como se nós não pudéssemos fazer nada contra estruturas que determinam, causam efeitos na sociedade, na forma de manifestações do racismo. Eu discordo dessa leitura”, disse.

Diante deste cenário, o professor afirmou tem trabalhado com a categoria do “racismo sistêmico”.

“Por exemplo, quando falamos do genocídio negro, não basta apontar o dedo para a ação de um policial que, legalmente, executa um jovem. Temos que reconhecer que há outras manifestações. O superior hierárquico desse policial, o comandante, o secretário da segurança pública, que gere a política de segurança e aposta numa logica de confronto e alta letalidade, o governador que coordena a política de segurança pública e a polícia. O fenômeno nunca é isolado, é preciso rastreá-lo, para identificar sua manifestação corretamente e cobrar respostas de todos os responsáveis pela sua reprodução e perpetuação na sociedade”, defendeu o professor Samuel Vida.

Confira o podcast na íntegra:

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