Especialista em Medicina do Sono alerta para a importância do descanso para crianças e adolescentes

"As telas precisam ser evitadas de 60 a 120 minutos antes da hora de dormir", disse Andrea Barral ao podcast do Portal M!

Por Bruna Ferraz
02/03/2024 às 08h00
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Foto: Arquivo pessoal
Foto: Arquivo pessoal

No dia 15 de março, é celebrado o Dia Mundial do Sono, que serve de lembrete sobre a importância do descanso de qualidade para a saúde do indivíduo. Também é um momento para se reforçar o alerta sobre os malefícios da insônia, em particular, e dos distúrbios do sono, de forma geral. No entanto, mesmo sendo um assunto que interessa a todos, um grupo específico tem causado preocupação quando o assunto é sono: o das crianças e adolescentes.

Segundo estudos da Fundação Oswaldo Cruz, 72% dos brasileiros sofrem de doenças relacionadas ao sono, entre elas, a insônia. Entre as crianças e adolescentes, a prevalência da insônia é estimada em aproximadamente 10% a 30% do público.

De acordo com esses levantamentos, o aumento dessa incidência nos últimos anos está intimamente relacionado aos hábitos sociais da família, incluindo maior utilização de dispositivos eletrônicos e redes sociais.

Para falar sobre isso, o podcast do Portal M! recebeu a médica pneumologista Andrea Barral. Especialista em Medicina do Sono pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a profissional atua na Rede D'Or/Hospital São Rafael, é responsável pelo ambulatório de Medicina do Sono do Hospital Especializado Otávio Mangabeira (HEOM) e também atende no Centro Médico Cardiopulmonar.

De acordo com a especialista, características cada vez mais evidentes na sociedade contemporânea, como excesso de trabalho, ansiedade e estresse, levam ao aumento sistemático do número de pessoas acometidas por distúrbios do sono, em especial pela insônia. O cenário se agravou durante a pandemia e no pós-pandemia de Covid-19.

"Os estudos brasileiros mostram que em 45% da população têm alguma queixa de sono, mas esse número pode ser ainda maior dependendo de como a pergunta é feita. Por exemplo, se em algum momento da vida você já teve alguma queixa de insônia, então a prevalência pode ser muito maior do que essa", detalhou.

Essas alterações afetam não apenas os adultos - pelo contrário, têm chegado às crianças e adolescentes cada vez mais cedo e com intensidade cada vez maior. Segundo Andrea Barral, o ideal é que o adulto jovem tenha uma média diária de oito horas de sono para que este seja um descanso reparador.

Quando se trata de um adolescente, no entanto, essa média sobe para nove horas. As crianças necessitam de mais tempo ainda - ou seja, quanto mais jovem, maior a demanda de horas para dormir, o que não tem sido seguido em boa parte das famílias.

"A gente tem que saber que horas esses adolescentes, essas crianças precisam acordar e ver, com base na quantidade de horas de sono que eles precisam, que horas eles precisam dormir. Dessa forma, a gente pode orientar toda uma rotina de sono, orientar uma higiene do sono adequada, bons hábitos de sono", indicou.

Uso de telas

Um dos problemas relacionados à má qualidade de sono é a exposição às telas, principalmente no período noturno, próximo ao momento de dormir. De acordo com a especialista, esse contato com tablets, celulares e notebooks deve ser evitado cerca de uma a duas horas antes do sono.

"A noite é um momento de quietude, de relaxamento, de desacelerar. As telas precisam ser evitadas de 60 a 120 minutos antes da hora de dormir. O acesso às telas, seja televisão, computador, celular, tablet, pode ser um estímulo, pois eles podem acessar conteúdos que são estimulantes. Além disso, a própria luminosidade, a luz de LED fria, emite um espectro azul de onda que impede a liberação do hormônio do sono. Então, a exposição às telas, próximo a hora de dormir, dificulta o início do sono por atraso na liberação do hormônio do sono. Portanto, a gente precisa conversar isso muito bem com essas crianças e adolescentes", pondera.

Na busca pela higiene do sono, Andrea Barral costuma realizar uma anamnese com os seus pacientes, para entender como funciona a rotina de sono, bem como a preparação para o descanso. Uma dica da especialista é a produção de um diário do sono, para que os responsáveis possam acompanhar a rotina de reparação de crianças e adolescentes de forma efetiva.

"A gente faz um diário de sono e vai acompanhando de perto essa criança e adolescente. Dependendo do resultado, se não melhorar com essas mudanças comportamentais, aí a gente vê a necessidade de continuar na investigação para identificar se existe algum outro fator que esteja justificando a dificuldade pra dormir", explica.

Melatonina para pequenos

Segundo estudo realizado entre 2012 e 2021 e publicado em 2022, nos Estados Unidos, pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças, houve aumento de 530% de casos de intoxicação pediátrica por melatonina, um hormônio natural usado como complemento na indução do sono. Segundo o relatório, entre os efeitos colaterais desse tipo de substância para bebês e crianças, estão distúrbios do sistema nervoso, gastrointestinais, cardiovasculares e metabólicos.

Andrea Barral destacou que a melatonina é um hormônio, não é um suplemento alimentar, e que atua em diversas funções do organismo. Na maioria das vezes, segundo a especialista, o indivíduo é capaz de liberar a melatonina. Dessa forma, se a pessoa tem uma higiene do sono adequada, ela dá oportunidade para que o seu próprio organismo libere fisiologicamente a melatonina.

Diante disso, a médica pontuou que o uso da melatonina é específico, indicado para poucas situações, e que precisa ser avaliado por um especialista, tanto para adultos quanto para crianças.

"Para além da melatonina, existem alguns outros medicamentos que podem ser utilizados, mas sempre o paciente precisa ser avaliado. Na maioria das vezes, a gente inicia o tratamento da insônia com o padrão ouro, que é a terapia cognitivo-comportamental. Então, se for necessário a ajuda medicamentosa, junto com a terapia a gente lança a mão de medicamentos, sempre conversando com o paciente. A ideia, se for possível, é usar o modimento pelo menor tempo [possível]", explicou.

Confira o podcast na íntegra: