ARTIGO: O prejuízo da troca de comando no Ministério da Saúde*

Olívia Santana

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17/04/2020 às 16h53
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Foto: Divulgação
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Em entrevista coletiva para anunciar a troca de comando no Ministério da Saúde, em meio à tenebrosa crise sanitária que nos atinge, o presidente da República continua subestimando o coronavírus e diz que a economia e o emprego precisam ser retomados. Diz que o povo mais humilde vai ter que sair para trabalhar porque o governo não é uma fonte de socorro eterno. Ou seja, nem bem pagou o auxílio emergencial e já está reclamando. É um governo que nunca fez nada pelos mais pobres.

Por sua vez, o novo ministro Nélson Teich, que nunca exerceu nenhum cargo público chega, sem paraquedas, dizendo que terá completo alinhamento com o presidente. Entretanto diz também que sua gestão será técnica, com base na ciência. Fica a questão: vai reforçar o isolamento social, pelo compromisso com a Ciência, ou vai acabar com ele, gradativamente, para ficar alinhado com Bolsonaro?

A situação do país é muito delicada. Pesquisadores projetam que a escala de testagem no Brasil deveria ser de 2,2 milhões de pessoas, para um plano mais consistente de enfrentamento à pandemia.  Só foram realizados até agora menos de 200 mil testes. Já tínhamos, até o último boletim de ontem,  30. 425 casos e 1.924 mortes, de acordo com o Ministério da Saúde. Mas a Fiocruz estima que já há no país 200 mil pessoas contaminadas pelo coronavírus, pois para cada caso confirmado, 9 outros não foram identificados.

Fato é que estamos despreparados para enfrentar essa luta grandiosa contra um inimigo pouco conhecido, que desafia a ciência e o mundo. A geografia da pandemia envolve grandes potências, com direito a lances de guerra, que disparou uma corrida desigual por suprimentos médicos. Um exemplo foi o episódio dos 600 respiradores comprados na China, pela Bahia e pelo Ceará, que foram arrebatados pelos Estados Unidos.

 Além da cinematográfica manobra feita pelo governo do Maranhão para driblar os Estados Unidos e garantir 107 respiradores e mais  200 mil máscaras para o seu estado.  O material comprado na China  teve que vir pela Etiópia para desembarcar diretamente em São Luís. E por incrível que pareça, tiveram que driblar até a alfândega brasileira, que em março chegou a bloquear a compra de um lote de aparelhos que o Maranhão tinha feito de uma empresa,  em Santa Catarina, e o governo federal bloqueou o transporte e redistribuiu a carga, prejudicando o estado do Nordeste.

Por causa do Bolsonaro, ficamos desnorteados e perdemos tempo e energia preciosos. Ao invés de sermos céleres na busca de respiradores e outros equipamentos adequados, na feitura de testes, na distribuição massiva de máscaras, no pagamento do auxílio emergencial, na mobilização do empresariado para ajudas excepcionais, na construção de hospitais de campanha nas capitais e no interior, ficamos e estamos discutindo se vamos fazer o que todo o mundo está fazendo, que é o isolamento social, ou se vamos fazer o tal isolamento vertical do Bolsonaro, que ninguém no mundo fez ou fará.

A vaidade do presidente é infinitamente maior que sua responsabilidade com a população. Sua peleja com o ministro foi exatamente naquilo que Mandetta fez de bom, acatar a orientação da Organização Mundial de Saúde. Aos olhos do povo,  isto deu ao ministro uma nítida e positiva diferenciação em relação a Bolsonaro e suas atitudes tresloucadas. Tirar Mandetta agora tumultua ainda mais o quadro, que já não estava tranquilo. Projeções indicam que a Covid-19 tende a explodir nas próximas semanas.

Por outro lado, nada como os desafios concretos para iluminar a mente humana. Mandetta não era defensor do SUS. Saiu fazendo loas ao SUS, aos hospitais públicos, aos profissionais da área da Saúde. Parecia um dos quadros da esquerda. Chegou a fazer uma grande defesa de todo o sistema público, uma grande ironia,  para quem, quando deputado federal,  sempre pautou suas iniciativas na direção do  sucateamento do próprio SUS, em favor dos grupos privados.

E aqui estamos nós seguindo nessa era de incerteza,  neste trem desgovernado, numa luta da vida contra a morte. Neste cenário, cresce a carga de responsabilidade dos governadores para fazer prevalecer o direito à vida do povo brasileiro.


*Olívia Santana é deputada estadual na Bahia