Diplomata brasileiro pede "engajamento global para a solução do conflito na Ucrânia"

Estabelecido na cidade ucraniana de Vinnytsia, Gerson Brandão atua para levar assistência à população atingida diretamente pela guerra

Por Bianca Carneiro e Osvaldo Lyra
16/05/2022 às 08h50
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Foto: Divulgação
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A pouco mais de completar três meses de conflito na próxima quinta-feira (24), a invasão da Ucrânia pela Rússia segue ainda sem perspectiva de terminar. Os conflitos já mataram milhares de pessoas, além de reduzirem cidades a escombros e obrigar outros milhões a deixarem suas casas.

Em meio a tragédia, o diplomata brasileiro das Organização das Nações Unidas (ONU), Gerson Brandão, tenta ajudar como pode. Estabelecido em uma cidade chamada Vinnytsia, no centro-oeste da Ucrânia, ao sul de Kiev, ele atua para levar assistência à população atingida diretamente pela guerra.

Gerson, que já trabalha há mais de 20 anos com a resolução de conflitos e gestão de catástrofes, diz lamentar profundamente pela guerra, que para ele "é desnecessária e triste". Em entrevista ao colunista do A Tarde e editor-chefe do Portal M!, Osvaldo Lyra, o diplomata avaliou os estragos do conflito para a população e ressaltou que quem mais sofre as consequências são os civis, que nada não têm a ver com a invasão.

"Justamente as primeiras vítimas da guerra são as pessoas inocentes, são os ucranianos, as crianças, as pessoas idosas, mulheres que tiveram que abandonar suas famílias, famílias que foram destroçadas, que tiveram que se separar por essa guerra. Então é um trabalho complicado de tentar assistir pessoas que nós sabemos que vivem um trauma inimaginável. O nosso trabalho prioritário é trazer assistência humanitária a essas pessoas vítimas da guerra, mas a gente sabe que o que elas precisam é paz e estabilidade", diz.

Apesar de atuar para garantir alimentação, abrigo, assistência médica, e sobretudo, assistência psicológica, para a população, Gerson afirma que os recursos que a Organização das Nações Unidas e parceiros dispõem ainda não são suficientes para trazer o que ele considera ser mais importante: paz e estabilidade. Do ponto de vista do diplomata, a guerra na Ucrânia se torna ainda mais "desnecessária" do que os outros conflitos, justamente porque o motivo está ligado diretamente à ONU.

"Esse conflito, acho que mais do que outros conflitos que a gente vê e acompanha as notícias nas últimas semanas, é uma guerra que ao final foi criada por um membro do Conselho de Segurança da ONU, que teoricamente tinha obrigação de zelar pela paz. Como sempre, a guerra é triste, desnecessária, e nesse caso acaba sendo ainda mais incoerente do que outras guerras que a gente conhece", pontua.

Para Gerson, apesar de ver o engajamento de vários países influentes na busca da paz, ele admite que mais países deveriam se envolver no conflito, principalmente, porque ele pode tomar dimensões maiores e ameaçar muito além da Europa, em uma perspectiva global.

"Hoje em dia nós não falamos de uma guerra na Ucrânia, nós não falamos de uma guerra na Europa. Nós falamos de uma guerra que tem um alcance global, que seja em função da crise econômica, que é uma das consequências dessa guerra, a gente fala mais e mais de segurança alimentar. Entre a Rússia e a Ucrânia nós temos vários países produtores de trigo e de milho, então vai ter um impacto na segurança alimentar mundial em função desse conflito aqui na Ucrânia. Então, é importante que haja um engajamento global para a solução desse conflito na Ucrânia", avalia.

Questionado por Osvaldo sobre o papel das empresas privadas também na proteção das pessoas no meio da guerra, Gerson diz que a atuação dessas entidades na busca pela paz é muito importante já que estamos vivendo "em um mundo mais e mais controlado pelo capital", no qual as empresas privadas detém "uma enorme influência sobre governos ao redor do mundo". 

"Sim, um aspecto importante dentro desta resolução de conflitos que a gente aguarda é justamente o engajamento de empresas privadas, de pessoas ao redor do mundo, que seja fazendo pressão sobre seus governos ou fazendo pressão sobre os governos que estão envolvidos diretamente no conflito. Então, é importante que esse engajamento global não seja só de chefes de estado, de chefes de governo, mas também sim de sociedade civil e, sobretudo, empresas privadas, como a gente conhece a importância do capital hoje no mundo", ressalta.

Gerson lembra ainda que toda guerra sempre tem um componente econômico importante. "Quando a gente fala desses conflitos, especificamente aqui na Ucrânia, a gente fala também de interesses econômicos. A região do Donbas, no leste da Ucrânia, é uma região muito rica em minério. Então, como infelizmente em quase todos os conflitos que eu acompanhei, que eu trabalhei nos últimos anos, existe um componente econômico bem importante. Existem interesses econômicos contrariados que acabam contribuindo para o conflito. Então, sim, é importante você aliar o capital na resolução de conflitos, porque os conflitos, em geral, têm um componente econômico importante", aponta.

Confira entrevista: