A bem da Bahia, Benin

Por Matheus Souza* 
07/05/2022 às 07h30
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Foto: Acervo pessoal
Foto: Acervo pessoal

Na música "Raiz de todo Bem", Saulo Fernandes assim canta nos seus versos iniciais: "Salvador Bahia / Território africano". Nada mais certo! Baianos e baianas, sabemos disso. Da África herdamos gigantesca parte de nossa cultura, de nossa identidade. Continente mãe, com ele aprendemos a falar, a comer, a rezar, a nos vestir, a nos curar, a fazer arte, música, dança, luta, tudo. 

A raiz de tudo, entretanto, não foi do bem. Como nossa história, ainda em carne viva, mostra, para cá foram trazidos, ao longo de séculos, africanos e africanas escravizados, de diversas regiões das terras maternas. Na travessia atlântica, muitos padeceram; também em fazendas de cana-de-açúcar, de café, de fumo... Mas resistiram, lutaram, nos formaram enquanto povo.

Do Benin, segunda maior região escravista da África, foram trazidos muitos de nossos antepassados. O contato da Bahia com o Benin fora intenso nos séculos XVIII e XIX, por conta do tráfico de pessoas. Depois do Movimento dos Malês (entendo que a palavra "revolta" minimiza indevidamente a real protuberância política do que ocorreu) na capital baiana, em 1835, muitos negros escravizados, e outros livres, foram "deportados" para lá, e lá permaneceram. Até hoje são conhecidos como "os brasileiros", ou agudás, em iorubá, e mantém muitas das tradições que temos aqui. 

Lá e cá, territórios africanos. Lá e cá, casas nossas e de nossos ancestrais. Lá e cá ainda há resistência e lutas necessárias. Símbolo desse "cordão umbilical de contas" que nos conecta, a Casa do Benin em Salvador comemora, em 06 de março de 2022, seus 34 anos. Importante equipamento memorial de nossa história, a Casa do Benin mantém vivo o passado e nos oportuniza conhecer melhor um país tão importante para nossa formação. Celebrar e relembrar é preciso!

Muito se deve ao Benin, e muito pode ser feito. Estes fatos, por si sós, já seriam suficientes para termos relações mais profundas com este país. Mas, muitos outros reforçam a lista de motivos para tanto: há o Acordo Cultural e de Cooperação Técnica que o Brasil tem com o país desde 1972; as oportunidades de turismo e negócios; a importância militar e estratégica do Benin como membro da Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul, aliança articulada pelo Brasil; a experiência com ações técnicas na seara agrícola com a participação da Embrapa (uma das oportunidades resultou até na cessão do título de Príncipe da Casa Real de Savalou ao empresário baiano Wilson Andrade); o fato de Salvador ser cidade irmã das beninenses Cotonou (desde 1987) e Ouidah (desde 2007) etc.

Há uma agenda diversa e necessária, que precisa ser trabalhada, mesmo que a África não receba tanta atenção do Itamaraty. A Paradiplomacia da Bahia pode, e deve, avançar nessas relações, com possibilidades de benefícios mútuos. "A final das contas", somos todos sim, território africano. A bem da Bahia, Benin; A bem do Benin, Bahia. 

*Internacionalista e Doutorando em Administração pela UFBA

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