"A César o que é de César"

Por Karla Borges*
24/01/2022 às 13h56
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Foto: Acervo Pessoal
Foto: Acervo Pessoal

O consumidor quando deseja comprar alguma coisa, normalmente, pesquisa o estabelecimento que vende mais barato. Se na sua rua tem uma padaria que comercializa tomate a 5 reais, ele opta pela mercearia que oferece a 3 reais. Com o imóvel não é diferente! Se o promitente comprador percebe que o apartamento do vizinho, exatamente igual ao que está sendo negociado, tem o IPTU sete vezes menor, ele preferirá desistir da compra ou adquirir um imóvel de menor imposto.

Desde 2014, essa situação tornou-se corriqueira em Salvador, agravada, ainda, pela incidência de outro tributo na venda do imóvel, o ITIV, que tem uma base de cálculo arbitrada pelo fisco soteropolitano, sem lei, 25% maior do que o valor venal do já altíssimo IPTU, inibindo, e, muitas vezes, inviabilizando a concretização do negócio imobiliário.

Todos os contribuintes da capital baiana, indistintamente, que receberam os seus imóveis após 2014, são penalizados duplamente pela tributação perversa do IPTU. Primeiro, porque não há limitação do valor do imposto, como ocorre com os imóveis entregues até 2013. Segundo, porque as parcelas a deduzir do imposto que permitiriam abrandar o peso da tributação, e, portanto, diminuir o seu valor, não foram reajustadas ao longo dos anos na mesma proporção.

Não se pode argumentar que a reposição da inflação era imprescindível para calcular o tributo em 2022, quando o mesmo tratamento não foi dado ao contribuinte no reajuste da parcela que ele tem direito de abater no valor final do IPTU. Os valores dedutíveis estão previstos na tabela de receita anexa à Lei 7.186/06 e estão sem atualização desde 2017. Basta consultar os boletos, que o cidadão verificará que os números permanecem os mesmos há cinco anos, causando um prejuízo de quase 30% aos proprietários de imóveis.

É lícito cobrar impostos. "Daí a César o que é de César" harmoniza-se perfeitamente com o papel do governo e o dever dos cidadãos. Os entes tributantes devem ser obedecidos, desde que as suas leis não violem a isonomia e a dignidade da pessoa humana. O IPTU de Salvador já vem demonstrando enormes distorções na sua cobrança, ferindo princípios constitucionais e desestimulando o setor imobiliário, tal qual o exemplo do tomate mais caro. 

Quando o Município estabelece deveres não justos, cabe a sociedade reagir em prol da igualdade de tratamento. Foi por conta de uma reforma fiscal e um aumento dos impostos que os romanos se rebelaram. Eles não foram aconselhados a não pagar os tributos, apenas alertados que, embora se deva respeitar as cobranças terrenas, não se deve esquecer os mandamentos sublimes. Desta forma, daí a César o que é de César; mas jamais daí a César o que é divino e o seu imóvel é sagrado!

 

*Professora de Direito Tributário e Auditora Fiscal da Secretaria Municipal da Fazenda de Salvador, graduada em Administração de Empresas (UFBA) e Direito (FDJ) ,Pós-Graduada em Administração Tributária (UEFS), Direito Tributário, Direito Tributário Municipal (UFBA), Economia Tributária (George Washington University), Especialista em Cadastro pelo Instituto de Estudios Fiscales de Madrid e Saúde Fiscal Municipal pelo Lincoln Institute (Boston).

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