Uma CPI pastelão

Por Adilson Fonseca*

Por Adilson Fonseca*
22/09/2021 às 08h00
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Foto: Divulgação
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"Se a hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude, o cinismo é a afirmação ostensiva do vício como virtude." - Olavo Luiz Pimentel de Carvalho (1947), é um filósofo, jornalista e ensaísta brasileiro.

Na comédia pastelão, Os Três Patetas (The Three Stooges), exibida na televisão brasileira entre 1952 a 1970, o grupo norte americano estrelado por Moe Howard, Larry Fine e Shemp Howard, mais tarde acrescidos de Curly Howard e Joe Besser, que se revezavam formando o trio, a tônica era sempre a farsa e o trambique, que invariavelmente acabavam mal ao grupo. No Brasil, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI da Covid) do Senado nada tem de comédia pastelão, mas sim de uma tragicomédia, numa mistura de acontecimentos pitorescos e na maioria das vezes risíveis.

Ao contrário da série televisiva norte americana que fez sucesso por mais de 30 anos, até 1970, a série televisiva da CPI da Covid foi criada em 13 de abril de 2021, e passou a ser exibida pela TV Senado em 27 de abril de 2021, com prazo inicial de três, e que foi prorrogado por mais três meses, devendo terminar em 05 de novembro de 2021. Sem um roteiro definido e por falta de enredo, deve ter o seu término antecipado para 23 de setembro, data anunciada, a princípio, para a apresentação do relatório final.

As Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs), como bem define o Regimento Interno do Congresso Nacional (Câmara e Senado), são uma das formas do Poder Legislativo exercer sua função fiscalizadora. São criadas por Ato do Presidente de cada uma das casas, para apurar fato determinado, mediante requerimento de pelo menos um terço dos parlamentares. Tem um prazo inicial de três meses, prorrogáveis por mais três. Ao final, deve apresentar propostas de melhorias da gestão pública.

Burlesca, tragicômica e feita na base da improvisação, de acordo com as conveniências dos seus principais personagens - o presidente, senador Omar Aziz, o vice-presidente, Randolfe Rodrigues, e o relator, Renan Calheiros - a CPI da Pandemia desidratou-se e com menos de cinco meses chegou a lugar nenhum. Do seu enredo, feito para investigar supostas omissões do Governo Federal no combate à pandemia do coronavírus, e do uso das verbas públicas federais por estados e municípios, ficou uma pauta única, que é derrubar, o governo do presidente Jair Bolsonaro. 

A CPI se transformou em um palanque eleitoreiro da oposição ao presidente da República, e mirou suas ações com vistas às eleições de 2022. Tanto é que ali já se auto declararam presidenciáveis os senadores Alessandro Vieira (PT) e Simone Tebet (MDB), além do próprio Renan Calheiros, que sonha com uma vaga de vice em qualquer chapa oposicionista. Há ainda o chamado G-7 (o grupo de oposição) que mira disputar a reeleição no Senado, ou governos estaduais em 2022.

Nesse palanque, nada se investigou sobre aplicação de recursos federais nos estados, apesar dos mais de 70 processos e inquéritos da Polícia Federal e Controladoria da União mostrando fortes indícios de fraudes. Os trabalhos foram focados unicamente no Governo Federal. A CPI da Covid virou CPI da Cloroquina, do Tratamento Precoce, da Copa América, do Desfile Militar, da compra que nunca aconteceu de vacinas, e se cogitou chamar para depor a ex-mulher do presidente Jair Bolsonaro, que acabou não acontecendo por absoluta falta de motivo para as investigações. 

O relatório final, a cargo do senador Renan Calheiros, foi definido nos primeiros dias de funcionamento da comissão, e foi se ajustando aos depoimentos direcionados com o intuito de criar provas contra o presidente da República, que deverá ser acusado de genocida, negligente, omisso e até de prática de curandeirismo e charlatanismo. A proposta a ser apresentada ao final dessa ação pantomímica, é o pedido de impeachment do presidente.

Desacreditada por causa dos seus vieses ideológicos, a CPI da Covid termina de um modo melancólico, sem qualquer contribuição digna de nota, nem mesmo a de ser uma comédia pastelão. Como a Legislação Eleitoral Brasileira não mais permite a realização de showmícios, com a contratação de artistas, restaram aos integrantes da CPI eles mesmos subirem no palco, e ali representarem o máximo para convencer seus supostos eleitores nas próximas eleições, em outubro de 2022. 

A hora do humor pastelão, contudo, já acabou, e a peça político teatral encenada nos últimos meses, e que já nasceu fadada ao fracasso de credibilidade, se revelou um fiasco. E sai de cena sem aplausos.

* Adilson Fonseca é jornalista e escreve neste espaço às quartas-feiras.

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