ARTIGO: Elogios: a falta e o excesso*

Por Sergio Manzione*
20/01/2020 às 12h32
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Foto: Divulgação
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O elogio pode parecer sempre algo bom, um estímulo, mas pode ser interpretado como pressão, colocando a pessoa na busca da perfeição. O excesso de elogios pode afetar profundamente a autoestima, mas nem sempre de forma positiva. A busca constante pela aprovação e reconhecimento dos outros pode causar frustração, depressão, ansiedade e todo tipo de sofrimento psíquico. Qual a dose certa de elogios?

O ser humano é gregário e, portanto, gosta de fazer parte de grupos sociais e conviver com seus semelhantes. Interagir com pessoas diferentes dá subsídios para ajustar as referências individuais de comportamento visando maior aceitação dos grupos. O ponto central é que o ser humano, além de interagir, para se sentir pleno precisa ser aceito pelos grupos aos quais faz parte, criando e mantendo o sentido de pertencimento. 

O elogio e a crítica vão indicar o caminho da aceitação da pessoa ou de um trabalho feito por ela. Os pais, em relação aos filhos, tendem a ficar em dois extremos: elogiar demasiadamente ou não elogiar. Elogios que exaltam a inteligência única do filho, como "meu filho é o mais inteligente da escola", transferem para a criança a responsabilidade de não decepcionar os pais, que podem projetar nos filhos a realização daquilo que eles não conseguiram ser ou fazer.  A criança passa a fazer de tudo para atingir o ideal desejado pelos pais e essa busca pode continuar na adolescência e na fase adulta. No entanto, no mundo real, não é possível ser o melhor sempre e em tudo ao mesmo tempo. Ao não conseguir atingir ou superar a expectativa dos pais, a criança tem grande sofrimento psíquico, pois teme perder o amor dos pais. 

Outra possibilidade é a criança interpretar o excesso de elogios como a certeza de que ela é diferenciada e a mais inteligente de fato, pois se os pais estão dizendo é a verdade. Essa criança se vê superior aos demais e passa a exigir tudo, inclusive obediência e subserviência dos outros, que, na visão dela, são inferiores e devedores. A criança com essas características poderá ser um adulto com dificuldades nos relacionamentos amorosos e/ou com grupos sociais, pois não suporta ser contrariado, afinal pensa possuir a verdade absoluta. Pode, ainda, tornar-se um chefe tirano, caso encontre oportunidade e esta pode, de fato, aparecer no mundo contemporâneo, onde muitos grupos, como é o caso nos ambientes corporativos, são altamente competitivos e exigem de seus integrantes comportamentos agressivos e impessoais para serem valorizados como vencedores, guerreiros, campeões e todo tipo de título onde só há um grande vencedor e muitos perdedores.

Como devemos elogiar para estimular e não pressionar?  Elogio e crítica são necessários para o indivíduo perceber se seu comportamento está de acordo com o esperado por um determinado grupo, seja, por exemplo, na elaboração de uma tarefa ou na postura diante de um problema familiar. O medo de arriscar e fracassar pode deixar a pessoa em sua zona de conforto permanente e isso poderá impedi-la de almejar melhores posicionamentos pessoais e profissionais. A falta de elogios e críticas, no entanto, pode sinalizar de forma errada, deixando a pessoa pensar que já faz tudo certo.  O problema, além da quantidade, está na qualidade do conteúdo e na forma como as críticas e elogios são feitos. Em excesso causa problemas, mas a ausência também é ruim, portanto, é preciso ter critérios para elogiar. 

O elogio deve ser feito para realçar o esforço que a pessoa faz para atingir um objetivo, sendo o resultado positivo ou não. Além disso, é preciso elogiar o esforço coletivo, mostrando que o trabalho conjunto é necessário e todas as pessoas do grupo são importantes. Numa empresa, a dosagem certa para o chefe elogiar está na valorização do trabalho em equipe, sem deixar de reconhecer o esforço de cada um, pois, em muitos momentos, o incentivo é mais importante que o elogio. Na prática, as pessoas devem sempre ser citadas, pois todos precisam ter referências acerca de seu desempenho pessoal para corrigir e aprimorar habilidades e comportamentos nas relações interpessoais com familiares, amigos ou colegas de trabalho.

O excesso ou a falta de elogios, reforços positivos ou feedbacks podem, portanto, favorecer o surgimento de dois tipos de indivíduos com reações opostas. O primeiro é rigoroso demais, impessoal e tirano, pois foi criado se vendo superior aos outros. O segundo é frustrado e com enorme sofrimento psíquico, porque vive, desde a infância, a busca incessante pela perfeição para agradar aos outros. Elogiar demasiadamente não dá margem para que a pessoa ou o outro possam errar. É preciso enxergar as pessoas como elas são e não como gostaríamos que fossem, sejam elas familiares ou desconhecidas. Isso ajuda na dosagem certa dos elogios.

*Sergio Manzione é psicólogo clínico, administrador, mestre em engenharia da energia e semanalmente fala sobre comportamento humano e psicologia na Rádio Câmara e no Portal Muita Informação! @psicomanzione