ARTIGO: O Poder absoluto

Por Adilson Fonseca*
15/07/2020 às 08h00
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Foto: Divulgação
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A célebre frase do jornalista, poeta e escritor Millor Fernandes (1923-2012) "Democracia é quando eu mando em você, ditadura é quando você manda em mim", traduz bem o atual momento político brasileiro. Na disputa pelo poder, Legislativo e Judiciário criticam abertamente o Executivo, onde está a figura do presidente Jair Bolsonaro, e não mais procuram disfarçar uma tentativa de mudarem de endereços, passando a ocupar o Palácio do Planalto.

Com mais apetite, o Judiciário, através do Supremo Tribunal Federal (STF) adota não apenas o ativismo político, mas também o pragmatismo das ações, onde interfere em todas as áreas do governo, da saúde ao meio ambiente, da economia às relações institucionais. No seu protagonismo político, o STF não apenas se configura como o poder supremo, guardião da Constituição, mas também como o Poder Absoluto, em que considera que tudo pode sobre os demais poderes da República.

Nos tempos atuais, o principal sinal de interferência do STF veio na decisão que retirou do Poder Executivo central (a Presidência da República) a tarefa de coordenar as políticas públicas para o combate à pandemia do Coronavírus (Covid-19), transferindo-a para estados e municípios. Mas mesmo assim deixou inequívoca posição de que a última palavra caberia aos juízes, que por sua vez poderá ser ou não acatada pelos próprios ministros do STF.

Ao longo dos últimos meses, contudo, as ações do STF, tomadas de forma colegiada, mas em sua maioria de forma monocrática, em que um único ministro, dentre os 11 que compõem a Corte, pode anular decisões do Poder Legislativo (Câmara e Senado), mas principalmente as do Poder Executivo. Isso se tornou evidente nas decisões monocráticas dos ministros Celso de Mello, Alexandre de Moraes e Luiz Roberto Barroso.

Atuando como última instância jurídica, muitas vezes como a única instância, o STF se arvora como a suprema corte, mas também agora a instância do poder absoluto. Ministros têm protagonizados arroubos considerados inconstitucionais e ditatoriais, atuando como vítimas, promotores, investigadores e juízes em inquéritos como os da fake news, e dos chamados atos antidemocráticos, com ações de investigações, busca e apreensão, prisões e julgamentos. Sem contestações acatadas, continuam incólumes nas suas trajetórias absolutistas.

São procedimentos que só mostram uma tendência imperial, que vão desde uma decisão unilateral de um ministro, Alexandre de Moraes, impedindo que o presidente nomeasse um diretor da Polícia Federal, mesmo tendo essa atribuição assegurada na Constituição, à ameaça do confisco do telefone presidencial, por Celso de Mello. Mais recentemente o ministro Gilmar Mendes criticou o Exército, acusando-o de ser conivente com um possível genocídio na pandemia do Covid-19. Foi preciso uma resposta dura do ministro da Defesa e dos demais comandantes das três forças, para colocar ordem no local.

No período do Império, a Constituição Brasileira de 1824 tinha quatro poderes, sendo que o Poder Moderador era exercido exclusivamente pelo imperador D. Pedro I, e era o voto de minerva nas decisões sobre os demais poderes, inclusive podendo destituir o chefe do Poder Executivo, e dissolver o Congresso Nacional, para convocar novas eleições. Foi abolido pela Constituição de 1891, já com o advento da República.

O Brasil é uma República desde 15 de novembro de 1889, e regido desde 24 de fevereiro de 1891, com a sua primeira Constituição Republicana (a primeira foi de 1834, ainda no Império). A Nação é constituída de três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) harmônicos e independentes. Talvez, contudo, os atuais signatários do Supremo Tribunal Federal tenham esquecidos dessa parte da história.

* Adilson Fonseca é jornalista e escreve sempre às quartas-feiras.
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