O ministro Flávio Dino, Supremo Tribunal Federal (STF), criticou, nesta última terça-feira (18), durante julgamento na Primeira Turma da Corte, o uso de estratégias administrativas, os chamados “penduricalhos”, para inflar os salários de juízes e desembargadores. Ele classificou essas práticas como “criatividade administrativa” e afirmou que tais manobras representam um constrangimento para o Poder Judiciário.

As declarações do ministro ocorrem em meio a revelações de que tribunais estaduais e órgãos do Ministério Público têm realizado pagamentos extras a magistrados, elevando os vencimentos acima do teto constitucional. A prática tem gerado intensos debates sobre transparência e respeito aos limites legais de remuneração no serviço público.

Uso de manobras financeiras gera críticas no STF

Segundo Flávio Dino, a concessão de benefícios acima do teto salarial estipulado pela Constituição representa uma violação das normas que regem a magistratura.

“Vemos uma criatividade administrativa, sobretudo em temas remuneratórios, que é algo que constrange o Poder Judiciário, porque temos uma moldura constitucional e o Estatuto da Magistratura, na Lei Orgânica da Magistratura, que, a cada dia, em ziguezagues hermenêuticos, é infelizmente driblada”, afirmou.

A ministra Cármen Lúcia reforçou a crítica, destacando que a transparência na remuneração dos juízes é um direito da população.

“Em afronta não apenas a magistratura e a ética da magistratura, as normas constitucionais, mas, principalmente, um avanço contra o direito do cidadão tem de saber a cada servidor público, que é o que nós somos, juízes, quanto se paga, qual é a remuneração, por que se paga e qual a base legal nem nenhum subterfúgio”, declarou a ministra.

Supersalários e pagamentos extras sob questionamento

A polêmica em torno dos vencimentos elevados no Judiciário ganhou destaque após a divulgação de um levantamento que revelou pagamentos acima do teto constitucional em diversos tribunais. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), tribunais estaduais e ramos do Ministério Público utilizaram sobras de caixa, em dezembro de 2024, para conceder benefícios que elevaram os salários de magistrados a valores exorbitantes.

Entre os casos mais chamativos, está o da desembargadora Silza Helena Bermudes Bauman, da Justiça do Trabalho, que recebeu R$ 788,3 mil brutos em um único mês. Em Minas Gerais, 32 magistrados tiveram contracheques superiores a R$ 300 mil, sendo que 97% dos juízes do estado ultrapassaram o teto salarial vigente. No total, os tribunais de Justiça desembolsaram pelo menos R$ 1,5 bilhão em pagamentos extraordinários apenas no último ano.

Decisões judiciais tentam conter abusos

Flávio Dino tem sido um dos principais críticos das manobras utilizadas para inflar os vencimentos no Judiciário. No mês passado, ele suspendeu uma decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que autorizava o pagamento retroativo de auxílio-alimentação ao juiz Daniel de Carvalho Guimarães.

Ao justificar sua decisão, Dino classificou a concessão de benefícios financeiros fora dos limites do funcionalismo público como um “inaceitável vale-tudo”. Segundo ele, práticas desse tipo comprometem a credibilidade das instituições e ferem princípios de igualdade e transparência no serviço público.

Outras carreiras jurídicas também são beneficiadas

De acordo com Dino, o problema não se restringe apenas à magistratura, ele apontou que mecanismos semelhantes também são utilizados no Ministério Público, na Advocacia Pública e nos tribunais de Contas. O ministro chamou a atenção para o que classificou como “saltos ornamentais hermenêuticos” – interpretações jurídicas flexíveis que permitem a concessão de benefícios indevidos a membros dessas carreiras.