O jurista Ives Gandra da Silva Martins fez duras críticas ao Supremo Tribunal Federal (STF) e acusou a Corte de extrapolar sua função técnica e atuar como um poder político. Segundo ele, os ministros estariam invadindo competências do Congresso Nacional, legislando e interpretando a Constituição “em causa própria”, em desrespeito à separação entre os Poderes prevista na Carta Magna.

“Independentemente da qualidade dos ministros, que eu respeito muito, isso viola a Constituição”, afirmou Gandra.

Para o jurista, a democracia brasileira se estrutura com base na representação popular no Executivo e no Legislativo, cabendo ao Judiciário apenas a aplicação técnica das leis. As declarações foram feitas durante um almoço em sua homenagem, na última sexta-feira (9), em um restaurante nos Jardins, bairro nobre de São Paulo. O evento celebrou os 90 anos de Gandra e reuniu familiares, amigos e juristas de destaque. Conhecido por sua longa trajetória no Direito e por sua atuação como professor, o aniversariante foi aplaudido de pé após o discurso.

‘Se o rei está nu, tem que se dizer’

Gandra também manifestou preocupação com o atual cenário político-institucional do país e classificou como um momento de “turbulência”. Segundo o jurista, os três poderes da República, especialmente em Brasília, têm se afastado da realidade da população. Ele defendeu a necessidade de posicionamentos firmes da sociedade diante de desvios institucionais.

Ao comentar sobre a atuação do Supremo, o jurista mencionou o uso de escoltas por parte dos ministros como um reflexo do desgaste da imagem do tribunal perante a população. “Hoje eles são obrigados a andar com seguranças porque se transformaram também em um poder político”, disse, ao criticar o que chamou de “ativismo judicial”.

“Se o rei está nu, tem que se dizer que o rei está nu, e não por conveniência ficar calado. Cada vez que nos calamos quando as coisas não andam corretamente, estamos colaborando com elas”, disse Gandra.

Trajetória de múltiplos talentos

Além de sua contribuição no campo jurídico, Ives Gandra é conhecido por sua versatilidade. Autor de obras jurídicas, ele também se dedicou à literatura, escrevendo mais de 200 sonetos dedicados à sua esposa, Ruth Vidal, falecida em 2021. Outro talento pouco conhecido do jurista é sua atuação como perfumista, um ofício herdado do pai, José da Silva Martins, imigrante português que representava uma empresa francesa de perfumaria no Brasil.

A paixão por perfumes foi lembrada na escolha do presente oferecido aos convidados do almoço: um frasco de essência de lavanda, aroma preferido do aniversariante. O cardápio do evento incluiu seis etapas, harmonizado com vinhos argentinos, em uma celebração marcada pelo requinte e pela admiração à trajetória do homenageado.

Presenças ilustres no almoço

O encontro contou com a presença de diversas figuras do mundo jurídico. Entre elas, o ministro aposentado do STF Francisco Rezek, o advogado Modesto Carvalhosa, o secretário estadual de Justiça e Cidadania de São Paulo, Fábio Prieto, e o secretário municipal de Mudanças Climáticas, José Renato Nalini – todos com carreiras consolidadas no Judiciário. Também compareceu Julio Casares, presidente do São Paulo Futebol Clube, time do qual Ives Gandra é conselheiro vitalício. O dirigente fez questão de prestar homenagens ao jurista, que é torcedor apaixonado e ativo na vida do clube.