Cinco nomes que provam: a nova literatura baiana está mais forte e necessária do que nunca
Nova safra de escritores baianos está tomando cenário literário nacional, mesclando tradição e inovação

Gigantes da literatura baiana, como Jorge Amado, Gregório de Matos, Castro Alves, Maria Luíza Machado e outros, contribuíram para a construção da história do estado e do Brasil. Hoje, uma nova safra de escritores baianos está tomando o cenário literário nacional, mesclando tradição e inovação para criar narrativas que ecoam as raízes culturais do estado e dialogam com as questões contemporâneas do país.
Esses autores conquistam leitores e críticos com vozes únicas, abordando temas como identidade, resistência e memória, e reforçam o papel da Bahia como um celeiro de talentos que continuam a transformar a literatura brasileira.
Juventude impulsiona a literatura baiana
Para o poeta e escritor de literatura negra Atanael Barros, a escrita surgiu como uma luz no fim do túnel. Em entrevista ao Portal M!, Barros destaca o papel central da juventude no fortalecimento da literatura baiana no Brasil e no exterior. Para ele, são os jovens que têm impulsionado a produção literária com novas perspectivas e questionamentos, evidenciando a cultura e os costumes da Bahia.
“A literatura baiana tem avançado bastante no cenário nacional, tem ganhado muita força e muita repercussão, e eu acredito que um dos principais diferenciais e o que tem impulsionado esse momento é a juventude. É essa juventude que desperta e que vem com essa garra, com essa força, para mostrar, através da sua literatura, os nossos costumes, as nossas tradições, as nossas festividades, as nossas crenças, mostrar o que a Bahia tem de melhor“, afirma o autor.

Nascido em Água Fria, no interior da Bahia, Atanael começou a escrever aos 14 anos. Em 2021, publicou ‘As Criações Poéticas de Um Jovem Aguafriense’, primeiro livro impresso de sua cidade natal. Em 2025, lança a obra ‘Preto da Realeza: Caminhos Poéticos para a Ancestralidade’, pela editora Ogum’s Toques Negros.
“Essa juventude tem sido mesmo diferencial, trazendo um novo cenário, novas perspectivas, novas possibilidades, novos questionamentos e tem contribuído de fato para que essa literatura ganhe asas e que ela voe por aí. Essa juventude vem com muita força“.
Embora reconheça a importância de grandes nomes da literatura brasileira como Jorge Amado, Clarice Lispector e João Ubaldo Ribeiro, Atanael Barros afirma que sua escrita não foi diretamente influenciada por esses autores. Ele destaca que sua literatura surge do enfrentamento ao racismo e da necessidade de afirmação da identidade negra.
“A escrita desses escritores dialoga bastante com a minha produção literária. Mas eu quero dizer que eles não influenciaram o meu processo de escrita. Eu sou escritor de literatura negra e a literatura negra é um movimento literário cujo sujeito da escrita é o próprio negro“, explica.
“O que me influenciou bastante foi ser atingido pelo racismo e não saber como lidar com isso. Então a minha escrita surge desse lugar, ou seja, ela surge desse não lugar, o desejo de querer ser reconhecido, contar a minha própria história“, completa o escritor.
Atanael afirma que sua trajetória pessoal se entrelaça com sua produção literária e destaca o impacto de seu trabalho em sua cidade natal e em outras regiões. O lançamento de seu primeiro livro foi um marco de reconhecimento e representatividade.
“Eu digo sempre que eu já nasci poeta, só que eu despertei aos 14 anos de idade. Eu despertei para bater de frente com o racismo e para dizer que nós somos capazes de ocupar qualquer espaço. Hoje, transformar todas essas narrativas, essas histórias, em literatura, é o que me motiva. E saber que hoje, na cidade de Água Fria e fora, existem vários escritores, crianças, jovens, adultos, que estão escrevendo a partir da minha arte, porque se inspiraram no meu trabalho, na minha literatura“.
Ele reflete sobre como a literatura negra foi essencial em seu processo de autoconhecimento e fortalecimento da autoestima, além de seu potencial como ferramenta de educação antirracista.
“O racismo é tão cruel que ele mexe com o nosso psicológico, mexe com a nossa autoestima, com a nossa saúde. E eu me achava um menino muito feio, achava meu cabelo feio, achava minha cor feia, eu não me achava inteligente“.
“Eu só vim descobrir a minha identidade com 14 anos de idade e devo isso à literatura negra. Foi a partir dessa literatura que eu entendi que eu era um homem negro, com características melanodérmicas, que eu sou um homem bonito, que eu sou intelectual“.
Literatura, educação e luta antirracista em diálogo com a ancestralidade
Professora, pesquisadora e escritora, Bárbara Carine é uma das vozes expressivas na educação e no combate ao racismo no Brasil. Popularmente conhecida nas redes digitais como: @uma_intelectual_diferentona, é graduada em Química e Filosofia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), e mestre e doutora em Ensino de Química pelo programa de pós-graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências da UFBA/UEFS.
Fundadora da Escola Afro-Brasileira Maria Felipa — primeira instituição do tipo reconhecida pelo Ministério da Educação —, ela articula educação e literatura como ferramentas de transformação social. Autora de 13 livros, ela destaca que sua produção literária é profundamente marcada pela vivência baiana. Sua obra mais recente, ‘E eu, não sou intelectual?’, discute sobre intelectualidade, diversidade e difusão do conhecimento.
“A Bahia me deu régua e compasso para ser quem eu sou e a minha escrita leva muito do que eu sou. A minha escrita é muito carregada de subjetividade das minhas histórias, da relação com as mais velhas da minha rua, na Fazenda Grande do Retiro, com a minha mãe, com a minha ancestralidade”.

Segundo ela, a cultura local influencia diretamente sua forma de compartilhar conhecimento, seja nas falas, seja na literatura. Questionando os parâmetros da tradição literária brasileira, Bárbara aponta o caráter excludente das referências que moldaram o cânone nacional.
“Quem estipulou essa tradição literária? Quem compõe essa tradição literária? Essa tradição tem classe social, tem cor, tem gênero”, analisa.
Ela revela que, mesmo com obras publicadas, levou tempo até se reconhecer no local de escritora.
“Só no meu oitavo livro eu parei de ter vergonha de me dizer escritora, parei de gaguejar ao me apresentar como escritora”, relata.
Para ela, esse processo de aceitação foi tanto pessoal quanto coletivo, resultado de uma construção com sua comunidade.
“Talvez, a tradição literária mereça um pouco de desrespeito nesse quesito”, afirma Bárbara, que propõe uma literatura mais plural e representativa, onde outras vozes, até então silenciadas, possam emergir com força e autenticidade.
Temas contemporâneos e recepção nacional
A escritora dedica sua produção a temas urgentes, como antirracismo, interseccionalidade de gênero, infância e divulgação científica negra.
“Tenho trabalhado muito com as temáticas anti-opressão, sobretudo no aspecto do antirracismo… é um universo de possibilidades que a literatura baiana tem e que são temas, para mim, contemporâneos e largamente essenciais”.
A repercussão de seu trabalho extrapola os limites da Bahia, alcançando diferentes estados do país.
“Tem sido muito gratificante pensar a recepção do meu trabalho fora da Bahia. (…) É sempre bonito ver o movimento de pessoas acessando minha literatura, os lançamentos do meu livro, sobretudo em Salvador”, celebra.
Ela relata que livrarias e auditórios lotados em outras cidades demonstram como sua literatura vem sendo acolhida nacionalmente. “Esse movimento do meu estado em relação à minha produção literária é um movimento muito positivo e muito fortalecedor. Eu sou muito grata, sou muito feliz por isso. Eu me sinto muito fortalecida, muito nutrida na Bahia para ganhar o Brasil”.
Educação, infância negra e produção literária
O cruzamento entre educação e literatura é uma marca evidente em sua obra, voltada à formação de professores e fortalecimento da identidade negra desde a infância.
“É uma literatura muito voltada para o fortalecimento das infâncias negras, para que crianças negras se vejam muito diferente de como eu me vi, se vejam positivadas, altivas, potentes, acessem suas memórias a partir de um outro lugar que não de subalternidade, subserviência, escravista, que elas possam entender o quanto nós somos gigantes do ponto de vista historiográfico e o quanto podemos ser incríveis no tempo presente e do quanto que elas podem sonhar grande, pensando aí o futuro”.
Seus livros, a exemplo de ‘Como ser um educador antirracista‘, ‘Educando crianças antirracistas’ e ‘Querido Estudante Negro‘, transitam entre o informativo e o subjetivo, sempre com base nas questões raciais e educacionais do Brasil.
Nova safra
A lista dos novos autores baianos que vêm se destacando no cenário literário nacional não para de crescer. A nova safra da literatura tem
Hugo Canuto é referência na união entre arte e ancestralidade africana. Nascido em Salvador, o autor se destaca como ilustrador e criador de histórias em quadrinhos. Foi o autor mais vendido da Flipelô em 2019, com a obra Contos dos Orixás, que adapta narrativas da cultura Yorubá para os quadrinhos. O trabalho rendeu a ele o Prêmio Ângelo Agostini de melhor lançamento e uma indicação ao Prêmio Jabuti. Entre suas publicações também estão A Canção de Mayrube e o segundo volume da série Contos dos Orixás.
Tatiana Amaral é um dos principais nomes da literatura erótica brasileira. Com 23 livros publicados, a escritora soteropolitana construiu uma carreira de sucesso no gênero. Tatiana também atua como produtora de audiobooks, como é o caso de Função CEO – A descoberta do prazer. Formada em administração, ela traz em sua trajetória experiências diversas, do esporte às artes cênicas, que enriquecem suas narrativas voltadas ao público adulto.
Breno Fernandes tem forte presença na literatura juvenil e adulta. Jornalista, professor e escritor, Breno nasceu em Salvador e possui formação em Letras, Jornalismo, Relações Internacionais e doutorado em Literatura. Estreou na ficção em 2002 com O mistério da casa da colina e, desde então, publicou obras como Mendax, o ladrão de histórias, finalista do Prêmio Biblioteca Nacional, Os fanzineiros e o romance adulto As fotos roubadas. Sua produção literária é marcada por temas contemporâneos e críticas sociais.
Vanessa Brunt alia literatura e produção de conteúdo digital. Nascida em Salvador, é autora de nove livros distribuídos no Brasil e em Portugal, como Depois Daquilo, Ir Também é Ficar e Não Precisa Ser Assim. Pós-graduada em Influência Digital, também se destaca por frases de impacto que circulam amplamente nas redes sociais. Vanessa mantém o blog “Sem Quases”, onde realiza análises de metáforas em filmes, músicas e outras expressões artísticas.
Matheus Peleteiro transita entre a poesia, o romance e a crítica social. O autor baiano publicou livros que vão do lirismo ao discurso político. Entre suas obras estão Nossos Corações Brincam de Telefone sem Fio, Tudo que Arde em Minha Garganta sem Voz e O Ditador Honesto. Seus títulos trazem reflexões sobre o cotidiano, questões existenciais e provocam o leitor com uma linguagem direta e sensível.
Itamar Vieira Júnior é um dos grandes nomes da literatura contemporânea brasileira. Natural de Salvador, é doutor em Estudos Étnicos e Africanos pela UFBA e autor de Torto Arado, livro vencedor do Prêmio LeYa em 2018. A obra conquistou destaque ao retratar o universo rural e a resistência das mulheres em contextos marcados por violência e opressão. Itamar também é autor de Dias, livro de contos, e do romance A oração do carrasco.
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