Verdadeira origem do ovo de Páscoa: de símbolo de fertilidade a tradição cristã
Símbolo de fertilidade e renascimento atravessou milênios e culturas, chegando ao chocolate moderno

Seja recheado, trufado, vegano ou de colher, o ovo de Páscoa é muito mais que um presente doce: é um símbolo ancestral de renovação e vida. Com raízes em culturas antigas como a persa, romana e eslava, o ovo atravessa milênios, adaptando-se às tradições cristãs e se reinventando no mercado contemporâneo. De ovos artesanais a opções gourmet, o que não falta é sabor e história para celebrar a Páscoa.
Na cultura persa, os ovos coloridos enfeitavam a mesa durante o Noruz, o festival de ano novo associado ao zoroastrismo, e eram consumidos ao fim da noite. Já na mitologia chinesa, o Universo teria nascido do ovo que abrigava Pan Ku, uma divindade cósmica. Entre os romanos, acreditava-se que o Universo possuía forma oval, reforçando a associação com o ovo. Para os eslavos, o ovo era vinculado ao deus do Sol, Dazhboh, sendo também uma forma de representar o renascimento após os invernos rigorosos.
“Essa comemoração com os ovos, ela é anterior ao cristianismo, os povos germânicos, os povos pagãos já faziam isso, comemoravam, pintavam os ovos e escondiam, E tem uma junção também dos povos cristãos com os povos romanos, Roma vai adotar o cristianismo como religião oficial no período imperial, com o fim de Roma eles vão mesclar sua cultura, com a cultura germânica, com a cultura pagã, com o que eles chamavam de bárbaros na época, e vão formar o feudalismo, e essas culturas vão se encontrar, os cristãos vão começar a usar o ovo também como fertilidade”, explica o historiador Murilo Mello.
Influência pagã e conexão com a primavera
Na Europa pagã, os ovos de Páscoa foram incorporados a rituais de celebração da primavera, como as festas em homenagem à deusa germânica Ostara. O equinócio da primavera, que marca o início da estação no Hemisfério Norte, acontece na mesma época da celebração da Páscoa cristã. Essas tradições influenciaram diretamente os rituais atuais, como a prática infantil de procurar ovos decorados escondidos em casa.
“No hemisfério norte também tem essa celebração, tinha essa celebração de trocar alvos de Páscoa, eles comemoravam o fim do inverno, o fim daquele tempo mais escasso, mais rigoroso, com menos alimento, mais difícil para sobreviver e o fim do inverno era muito comemorado, o equinócio”, esclarece Murilo.
A introdução cristã: o ovo como metáfora da ressurreição
Com o avanço do cristianismo, o significado simbólico do ovo foi assimilado à teologia da ressurreição de Jesus Cristo. Algumas lendas explicam essa relação. Uma das mais conhecidas, popular entre os ortodoxos gregos, conta que Maria Madalena levou ovos para presentear o imperador romano ao anunciar a ressurreição de Cristo. Ao ser zombada, os ovos em sua cesta teriam milagrosamente se tornado vermelhos, simbolizando o sangue de Cristo.
“A Páscoa ela é judaica. Então os judeus sempre comemoraram a Páscoa e o cristianismo vai celebrar, não vai deixar passar em branco a morte de Cristo, que acontece numa sexta-feira antes da Páscoa, e a ressurreição. Então o cristianismo termina copiando dos judeus a celebração da Páscoa inserindo a morte e a ressurreição de Cristo dentro daquela antiga Páscoa judaica”, explica Murilo Mello.
Há também histórias que relacionam o ovo à tumba de Jesus: assim como um ovo parece inerte, mas gera vida, o sepulcro de Cristo também revelou uma nova vida com sua ressurreição.
“Em relação aos ovos de Páscoa. Fertilidade, é vida, é nascimento, é uma associação ao renascimento de Cristo, o ovo representa a vida, tem uma vida ali dentro que vai eclodir”, afirma o historiador.
Tradição medieval: da abstinência ao banquete de Páscoa
Durante a Idade Média, a Igreja Católica proibiu o consumo de ovos, carne e laticínios durante a Quaresma. Por isso, os ovos tornaram-se alimentos valorizados após o período de jejum. Muitos camponeses, inclusive, usavam técnicas para criar ovos falsos que pudessem ser usados simbolicamente.
Com o fim do jejum, os ovos voltavam à mesa em banquetes, junto com carnes como o cordeiro, outro símbolo de renovação. Na Inglaterra do século 17, o cozinheiro John Murrell chegou a recomendar “ovos com molho verde”, uma receita com folhas de azedinha.
Além disso, era comum oferecer ovos como dízimo às igrejas na Sexta-Feira Santa, uma possível origem do costume de presentear com ovos.
A tradição de decorar ovos e o valor simbólico das cores
A prática de decorar ovos de Páscoa é registrada desde o século 13. O rei Eduardo I da Inglaterra teria presenteado cortesãos com ovos envoltos em folhas de ouro. Com o tempo, as cores ganharam significados: o vermelho, extraído de beterrabas e plantas rubiáceas, simbolizava o sangue de Cristo. O amarelo, comum nas cascas de cebola, também era popular.
Na Inglaterra vitoriana, flores e pétalas eram usadas para imprimir desenhos nos ovos. O Museu Wordsworth ainda preserva uma coleção de ovos decorados na década de 1870.
A chegada do chocolate: luxo e transformação da tradição
A ligação entre ovo de Páscoa e chocolate é mais recente. O chocolate chegou à Inglaterra no século 17 como uma bebida exótica e cara, consumida principalmente pela aristocracia e oferecida como presente de alto valor. Havia até debates religiosos sobre se a bebida quebrava o jejum da Quaresma. A conclusão: se preparado com água, o chocolate era permitido.
“Esse símbolo, essa confraternização, transformando o chocolate, uma coisa moderna, o chocolate vem do cacau daqui da América, os europeus só vão conhecer depois da chegada na América a partir de 1500, aproximadamente, e eles vão importar o chocolate lá para a Europa e só no século XIX que a gente consegue transformar em barra, solidificar o chocolate, então esse povo solidificado só vai acontecer no século XIX”, explica Murilo.
Foi apenas em 1847 que a empresa inglesa Fry’s criou as primeiras barras de chocolate sólido, facilitando o acesso ao produto. Em 1873, a mesma empresa lançou o primeiro ovo de Páscoa de chocolate, combinando a tradição pagã e cristã com o luxo do chocolate vitoriano.
Ainda assim, no início do século 20, os ovos de chocolate eram considerados tão especiais que muitas pessoas sequer os comiam. Há relatos de ovos guardados por décadas como recordações.
Industrialização e democratização dos ovos de chocolate
A popularização dos ovos de Páscoa de chocolate se intensificou nas décadas de 1960 e 1970, quando supermercados começaram a comercializá-los em larga escala, a preços acessíveis. Desde então, o item se tornou parte essencial da celebração contemporânea da Páscoa.
“Foi ressignificado com certeza, o capitalismo, o mundo moderno significa transforma em produto, os produtos têm uma característica original de quando foi criado, mas ele é reelaborado para se tornar atraente para o consumidor”, afirma o historiador.
Atualmente, os ovos estão disponíveis em diferentes formatos e estilos, como os ovos artesanais, recheados com trufas ou brigadeiro, os ovos veganos, feitos sem ingredientes de origem animal, e até versões personalizadas. Apesar de variações na forma e no conteúdo, o significado simbólico do ovo permanece, adaptando-se às mudanças culturais e econômicas ao longo dos séculos.
“Ao longo do tempo, ele ganhou mais um aspecto comercial, um aspecto de celebração também, não deixa de ser uma celebração, né, é relacionado bastante a brincadeira de criança, hoje, une as famílias e estabelece a relação das pessoas mais velhas da família com as pessoas mais novas”, comenta Murilo.
Tendências e o futuro dos ovos de Páscoa
Com desafios como o aumento do preço do chocolate, preocupações ambientais e até questões sanitárias, como a gripe aviária que impacta a produção de ovos naturais, a tradição do ovo de Páscoa pode continuar se reinventando. No entanto, sua presença simbólica e cultural mostra grande resistência e capacidade de adaptação.
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