O cenário de abandono de mulheres grávidas tem sido um tema recorrente que, recentemente, ganhou destaque nos holofotes da mídia após a cantora Iza revelar publicamente a traição de seu namorado Yuri Lima, pai de Nala, sua primeira filha. Este incidente trouxe à tona questões profundas sobre relacionamentos, responsabilidade parental e as consequências emocionais para as mulheres envolvidas.

Para entender melhor este quadro complexo, o Portal M! buscou a psicóloga Rafaela Lyra, especializada em Psicologia Perinatal e da Parentalidade, além de Psicologia Hospitalar. Segundo ela, comportamentos tóxicos como o abandono durante a gravidez muitas vezes refletem padrões de relacionamento disfuncionais.

“As razões pelas quais uma pessoa apresenta comportamentos tóxicos em um relacionamento, são diversas e bastante complexas. Isso envolve a história de vida dessa pessoa, o ambiente em que viveu, as experiências que teve em sua vida, de uma certa forma, as negativas, exposição a modelos de comportamentos que também eram tóxicos, dificuldade nas habilidades socioemocionais etc. Sempre é importante saber se essa pessoa na infância não teve muito afeto, ou até teve, a ponto de ser ‘sufocada’, muita permissividade, e então ela cresce sem saber lidar com limites e ser contrariado, por exemplo”, apontou.

Outro quadro destacado pelo especialista está relacionado às mentiras. Ela explicou que existem situações em relacionamentos interpessoais, em que muitas vezes, mentiras são sustentadas para que as pessoas não enfrentem a realidade e assumam suas responsabilidades diante dos fatos.

“Aprendemos a mentir na infância, pois associamos, muitas vezes, que falar a verdade vai gerar uma punição. E isso acontece porque em outra experiência, quando assumimos e falamos a verdade, tivemos a punição. Então, para evitar os prejuízos e punições, geralmente pessoas tóxicas sustentam a mentira. Mas, não necessariamente de forma intencional, fria e calculista, mas por insegurança, egoísmo, insensibilidade aos sentimentos”, ressaltou.

Tóxico x abusivo

A psicóloga chamou atenção ainda para a diferença entre o indivíduo tóxico e o indivíduo abusivo. De acordo com ela, geralmente as pessoas abusivas calculam, premeditam e agem negativamente de forma intencional.

“Já o indivíduo tóxico, muitas vezes não tem noção do que está fazendo, apesar de estarem agindo sem empatia, de forma egoísta, se vitimizando, dramatizando. E isso é consequência de um repertório de vida e da ausência de habilidades sociais”, explicou.

O que o caso Iza ensina a sociedade?

Ao comentar o recente caso envolvendo a cantora Iza, a especialista ressaltou o fato de que decisão de viver um relacionamento requer a responsabilidade afetiva dos dois lados. “Todos nós, adultos, somos responsáveis pelo nosso comportamento quando estamos em contato com o outro. Mas o que acontece, muitas vezes é que não refletimos o quanto nosso comportamento pode influenciar no emocional do outro”, alertou.

Por sua vez, quando isso engloba também o desejo de ter filhos, Rafaela enfatizou se tratar de uma decisão “muito séria e importante”, de ambas as partes. Para tanto, é necessário entender que será um momento transformador na vida do casal, mas sobretudo na mulher, pois será quem passará por transformações significativas, tanto físicas, quanto fisiológicas, emocionais e sociais.

“Terá mal estar, alterações na dinâmica sexual tanto na gravidez quanto no pós-parto, mudança na rotina e no trabalho, entre tantos outros desafios relacionados ao ‘ser mulher e mãe’ em uma sociedade que, infelizmente ainda é muito machista e julga como ‘super mãe aquela mulher que se sobrecarrega tentando dar conta de todas as demandas e esquecendo do mais importante: seu autocuidado, saúde e bem-estar físico e emocional”.

Em função deste cenário, a psicológa defendeu que a parceria e alinhamento do casal de forma igualitária na vivência da maternidade e paternidade é importante para a família. “E isso não só deve ocorrer após a chegada dos filhos, mas desde o momento em que se relacionam e decidem tê-los”, pontuou.

Acompanhamento às mulheres grávidas vítimas de abandono

Outra temática importante está ligada ao acompanhamento necessário às mulheres grávidas que lidam com o abandono na relação. Conforme a psicóloga, durante a gravidez, a mulher passa por um turbilhão de emoções, e lidar com questões como traição, abandono ou separação, são fatores externos que podem ocasionar ansiedade, depressão ou outros problemas relacionados ao parto e pós-parto.

“[Se] a mulher vivencia a situação estressora, o seu corpo libera cortisol, que é um hormônio conhecido como ‘hormônio do estresse’ e sua liberação desse hormônio, eleva os níveis de tensão no organismo. As consequências dos altos níveis de cortisol, estão relacionados à partos prematuros, RN baixo peso, alterações significativas de humor no pós-parto, atrasos do desenvolvimento do bebê”, listou.

Por conta disso, a especialista enfatizou que o acompanhamento psicológico se faz extremamente importante para a mulher, o casal e a família, durante o período perinatal. “Planejamento de uma gestação, tentativas do engravidar, durante a gravidez, no momento do parto, no pós-parto. No caso de Iza em específico, faz-se necessário o acompanhamento psicológico agora na gravidez, prevenindo adoecimentos agora e no pós-parto, além de lhe prepará-la para seu parto, momento que há necessidade de a mulher estar extremamente entregue”.

Segundo ela, esse tipo de acompanhamento pode ser realizado através do ramo da psicologia perinatal, área especializada no cuidado a grávidas, parturientes, puérperas e mães. “Ou seja, mulheres que se encontram no período perinatal, desejam planejar vivê-lo ou estão em constantes tentativas, bem como também, mulheres que passaram pela perda de seus filhos, o luto perinatal”.

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