Suicídio pode estar mais perto do que se pensa

Nos últimos anos, doença tem se tornado um dos maiores desafios de saúde pública no mundo todo e aqui no Brasil não é diferente


Redação
Redação 12/09/2024 12:40 • Artigos
Suicídio pode estar mais perto do que se pensa -

É difícil acreditar, mas a cada 40 segundos, uma pessoa tira sua própria vida em algum lugar do planeta. Só em 2021, mais de 14 mil brasileiros morreram por suicídio (média de 38 suicídios por dia). Entre os jovens de 15 a 29 anos, o suicídio já é a segunda maior causa de morte, perdendo apenas para acidentes de trânsito. Os dados são assustadores e mostram o quanto precisamos falar sobre o suicídio, sem medo e sem tabu, porque, muitas vezes, o silêncio pode ser fatal.

Nos últimos anos, o suicídio tem se tornado um dos maiores desafios de saúde pública no mundo todo e aqui no Brasil não é diferente. Recentemente, dados ainda mais preocupantes mostram o quanto o suicídio entre jovens se tornou uma questão urgente aqui no país. Entre 2011 e 2022, a taxa de suicídio entre jovens cresceu, em média, 6% ao ano, sendo que três crianças ou adolescentes se matam por dia no país. Além disso, as notificações de autolesões entre jovens de 10 a 24 anos aumentaram cerca de 29% ao ano nesse mesmo período. Essa faixa etária é importante, pois 50% dos problemas de saúde mental surgem antes dos 14 anos.

Esses números são ainda mais alarmantes quando comparados com os da população em geral, onde a taxa de suicídio cresceu 3,7% ao ano, e as notificações de autolesões aumentaram 21% ao ano. Outro número que passa desapercebido é de que para cada suicídio concretizado, houve 20 tentativas, em média no mundo. O fato impressionante, mas que fala por si, é de que 80% das mortes por suicídio ocorrem em países de média e baixa rendas.

Os resultados vêm de uma análise de quase 1 milhão de dados, realizada pelo Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz Bahia), em parceria com pesquisadores de Harvard, e foram publicados recentemente na revista The Lancet Regional Health – Americas.  Esses números mostram que precisamos de ações mais eficazes para prevenir o suicídio, especialmente entre os jovens, e reforçam a necessidade de uma abordagem mais ampla que envolva toda a sociedade.

Setembro Amarelo e conscientização

Divulgação

Diante desse cenário, quero falar sobre o Setembro Amarelo, uma campanha essencial para a prevenção do suicídio. Você sabia que o mês de setembro foi escolhido por causa de uma história tocante que começou em 1994 com um jovem chamado Mike Emme?  Ele tinha apenas 17 anos e vivia no Colorado, nos Estados Unidos. Mike era um jovem carismático e generoso, apaixonado por carros antigos. Com suas próprias mãos, ele restaurou um Mustang 1968, que pintou de amarelo, e esse carro acabou se tornando um símbolo de sua personalidade vibrante.

Infelizmente, apesar de sua alegria aparente, Mike enfrentava um sofrimento emocional profundo, que poucos ao seu redor conheciam. No dia 8 de setembro de 1994, ele tirou a própria vida, deixando um bilhete para os pais com um pedido de perdão.

A morte de Mike foi um choque para todos, mas sua família e amigos decidiram que sua partida não seria em vão. Eles usaram o carro amarelo de Mike como símbolo para promover a conscientização sobre a necessidade de falar sobre o suicídio. Durante o funeral, distribuíram cartões amarrados com fitas amarelas, incentivando as pessoas a “escolherem a vida” e a buscarem ajuda se estivessem em sofrimento. A iniciativa começou localmente, mas logo se espalhou pelos Estados Unidos, e depois para outros países.

Hoje, o Setembro Amarelo é um movimento global, incluindo o Brasil, e nos lembra que o suicídio é uma questão que pode atingir qualquer um de nós. Precisamos reconhecer os sinais, acolher e apoiar aqueles que estão em sofrimento. Falar sobre suicídio pode salvar vidas.

Sinais de alerta e situações de risco

Então, como podemos ajudar? Primeiro, é preciso saber reconhecer os sinais de alerta. Comportamentos diferentes, falas frequentes sobre morte ou comportamentos de risco são indícios que não podemos ignorar. Existem também algumas situações específicas que podem aumentar o risco de suicídio, como:

·     mudanças de comportamento: preste atenção às mudanças bruscas de humor, isolamento repentino, descuido com a aparência pessoal, alterações no sono ou no apetite e comportamentos autodestrutivos. Esses sinais podem indicar que a pessoa está em crise;

·     histórico familiar de suicídio: pessoas que tiveram um familiar próximo, que cometeu suicídio estão mais vulneráveis, seja por fatores genéticos ou pelo impacto psicológico;

·     doenças mentais: transtornos como depressão, ansiedade e bipolaridade estão fortemente associados ao risco de suicídio;

·     uso de substâncias: o abuso de álcool e drogas pode alterar o julgamento, aumentar a impulsividade e afetar o humor, elevando o risco de suicídio;

·     experiências traumáticas: traumas, como abusos e violência, também são fatores significativos de risco.

Se você perceber esses sinais em alguém próximo, não hesite em agir. Às vezes, um simples gesto de escuta pode fazer uma enorme diferença.

Como ajudar e a importância da psicoterapia

Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), 90% dos suicídios poderiam ter sido evitados e, portanto, quero reforçar o quanto a psicoterapia é importante, não apenas na prevenção do suicídio, mas também no fortalecimento emocional. A psicoterapia ajuda a tratar o sofrimento nas crises e fortalece a pessoa para enfrentar desafios futuros. É um investimento em saúde mental e qualidade de vida.

Uma das formas mais importantes de ajudar é estar presente, ouvindo com empatia e sem julgamento. Quando alguém compartilha seus sentimentos, mesmo que sejam negativos ou desesperadores, é essencial validar essas emoções e oferecer apoio sem minimizar o sofrimento. Frases como “Eu me importo com você” ou “Estou aqui para ajudar” podem ser muito poderosas.

Outras formas de ajudar incluem:

·     mostrar-se disponível: manter o contato regular com a pessoa e se mostrar presente, seja através de uma visita, uma ligação ou mesmo uma mensagem de texto. A sensação de apoio pode ajudar a pessoa a se sentir menos sozinha;

·     incentivar a busca por ajuda profissional: muitas vezes, a pessoa em sofrimento não consegue dar o primeiro passo para procurar ajuda. Ofereça-se para ajudar a marcar uma consulta ou acompanhar a pessoa ao psicólogo ou psiquiatra;

·     auxiliar na criação de um plano de segurança: ajude a pessoa a elaborar um plano de segurança, incluindo uma lista de contatos de emergência, estratégias de distração e locais onde ela se sinta segura;

·     evitar julgamentos ou críticas: não faça julgamentos, críticas ou dê conselhos simplistas como “Isso é frescura”, ou “Basta ter força de vontade”, ou “Isso é falta de Jesus em sua vida”. Esses comentários podem aumentar o sentimento de isolamento e desesperança, e não resolvem nada;

·     conhecer os recursos disponíveis: esteja ciente de recursos locais e nacionais de apoio, como o CVV (Centro de Valorização da Vida), que oferece apoio emocional pelo telefone 188, chat ou e-mail (veja os links no final do artigo).

Como agir diante de uma tentativa imediata de suicídio

Se você estiver diante de alguém que está prestes a tentar o suicídio, é importante agir com rapidez e calma. Veja algumas orientações que podem ser cruciais nesse momento:

1.  Fique calmo e demonstre empatia: mantenha-se calmo e fale com a pessoa de forma tranquila, demonstrando que você está lá para ajudar. Use uma linguagem simples e carinhosa, e não discuta ou contradiga os sentimentos dela. Frases como “Estou aqui com você” ou “Vamos encontrar uma solução juntos” podem ajudar a criar um ambiente mais seguro;

2.  Não deixe a pessoa sozinha: se possível, nunca deixe a pessoa sozinha nesse momento. A sua presença pode oferecer um suporte emocional fundamental e impedir que ela tome uma decisão impulsiva;

3.  Chame ajuda imediata: entre em contato com serviços de emergência locais, como o SAMU (192) ou a Polícia Militar (190), e informe a situação com clareza. Diga que há uma tentativa de suicídio em andamento, forneça o endereço exato e qualquer outra informação relevante. Peça ajuda para alguém próximo a você, se necessário, para manter a pessoa segura enquanto a ajuda não chega;

4.  Remova acessos a meios perigosos: se for seguro para você, remova qualquer objeto que possa ser usado para autoagressão, como armas, facas, cordas ou medicamentos. No entanto, não tente remover objetos de forma agressiva ou que possa parecer ameaçadora, pois isso pode agravar a situação;

5.  Tente falar com a pessoa: pergunte diretamente se ela está pensando em se machucar ou se sente vontade de morrer. Estudos mostram que perguntar sobre suicídio não aumenta o risco de que a pessoa o cometa; na verdade, muitas vezes pode trazer alívio e abrir um caminho para o diálogo;

6.  Ofereça ajuda para profissionais: sugira à pessoa que busque ajuda profissional, oferecendo-se para acompanhá-la ou ajudá-la a entrar em contato com um psicólogo, psiquiatra ou com o Centro de Valorização da Vida (CVV) pelo telefone 188;

7.  Chame outros apoios: se possível, entre em contato com amigos próximos ou familiares da pessoa, que possam oferecer apoio adicional;

8.  Monitore a situação: mesmo após o risco imediato passar, continue acompanhando a pessoa de perto. É importante estar presente, verificar como ela está se sentindo e incentivar a busca por tratamento contínuo, como psicoterapia e acompanhamento médico.

Estas ações podem fazer a diferença entre a vida e a morte. Não subestime o poder do apoio emocional e da presença nesse momento crítico. A ajuda imediata é fundamental para proteger e salvar vidas.

Papel das políticas públicas e da educação

No Brasil, já existem algumas políticas públicas destinadas à prevenção do suicídio. O Ministério da Saúde, por exemplo, lançou a “Agenda Estratégica de Prevenção ao Suicídio e Promoção da Saúde Mental” em 2017, com ações para melhorar o acesso aos serviços de saúde mental, como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), e ampliar as campanhas de conscientização, como o Setembro Amarelo. Além disso, existe o telefone 188 do Centro de Valorização da Vida (CVV), que oferece atendimento gratuito e confidencial a pessoas em sofrimento emocional.

Em outras partes do mundo, diversos países têm implementado políticas específicas para a prevenção do suicídio. Na Austrália, o programa “LifeSpan” combina intervenções baseadas em evidências, como a restrição do acesso a meios letais, treinamentos para profissionais de saúde e campanhas de conscientização pública. No Reino Unido, o governo lançou a “Estratégia Nacional de Prevenção do Suicídio”, que inclui a formação de grupos comunitários de apoio e a integração dos serviços de saúde mental. No Japão, onde as taxas de suicídio sempre foram altas, medidas como a restrição do acesso a locais perigosos, e o aumento do suporte psicológico e financeiro a pessoas em crise mostraram resultados positivos. A Nova Zelândia também adotou uma abordagem integrada de saúde mental, educação e bem-estar, com o objetivo de reduzir as taxas de suicídio juvenil.

Essas iniciativas demonstram que a prevenção do suicídio exige uma combinação de políticas públicas eficazes, recursos acessíveis de saúde mental e campanhas de conscientização que incentivem a sociedade a falar sobre o problema abertamente. É preciso falar abertamente sobre o tema nas escolas, que pode ser abordado em conjunto com o tema “bullying”. Rodas de conversa, palestras de especialistas e outras iniciativas são fundamentais. Lembre que suicídio não é notícia, mas é um assunto para ser discutido abertamente! O diálogo é sempre a melhor opção!

Apelo final

Para finalizar, quero pedir que você compartilhe essas informações com amigos e familiares. O conhecimento é uma das ferramentas mais poderosas que temos na prevenção ao suicídio. Se quiser saber mais, ouça os episódios do meu podcast, Psicologia Cotidiana, onde falo sobre como o estresse extremo e o esgotamento emocional podem impactar a saúde mental.

Caso você tenha pensamentos suicidas ou qualquer tipo de sofrimento lembre-se de que sempre há uma opção, e que você não está sozinho, procure ajuda especializada com o CVV (Centro de Valorização da Vida) e nos CAPS (Centros de Atenção Psicossocial) O CVV funciona 24 horas por dia (inclusive aos feriados) pelo telefone 188, e também atende por e-mail, chat e pessoalmente. São mais de 120 postos de atendimento em todo o Brasil. Buscar o auxílio de um profissional de saúde mental é fundamental para sair de qualquer tipo de sofrimento. A ajuda está disponível, e pedir ajuda pode ser o primeiro passo para encontrar um novo caminho.

*Sergio Manzione é psicólogo clínico, administrador, podcaster, colunista sobre comportamento humano e psicologia no Portal Muita Informação!, e escreveu o livro “Viva Sem Ansiedade – oito caminhos para uma vida feliz”. @psicomanzione

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