Racismo e Tributação no Brasil: Você deve estar pensando, o que tenho a ver com isso?
Leonardo Queiroz, mestre e doutorando em Direito pela UnB, aborda questões relacionadas ao racismo e a tributação no Brasil
Divulgação
Por Leonardo Queiroz*
No final do mês de outubro, entre os inúmeros acontecimentos importantes que se sucederam no país, dois fatos merecem destaque. Por coincidência, ou não, foram sucedidos pelo intervalo de apenas um dia. O primeiro diz respeito à divulgação de um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA, que demonstra que as distorções do sistema tributário brasileiro fazem com que os contribuintes mais ricos paguem proporcionalmente menos impostos do que pessoas com rendimentos menores, a exemplo dos trabalhadores assalariados.
Em seguida, na Câmara dos Deputados, uma proposta de criação de um imposto sobre grandes fortunas foi rejeitada pelo plenário. É oportuno enfatizar que a Constituição Federal de 1988 trouxe esta previsão em sua primeira versão, e que até o momento não foi regulamentada pelo Congresso Nacional. Perceba-se que não se trata de uma inovação jurídico-política, cuida-se apenas de colocar em vigor uma garantia constitucional.
Neste contexto, a pesquisa desenvolvida pelo IPEA demonstra que os mais pobres pagam proporcionalmente mais tributos, o que apenas confirma uma série de outros estudos feitos ao longo das últimas décadas, inclusive trabalhos realizados pela própria instituição. No entanto, o instituto falha em não observar que, na realidade brasileira, as pessoas mais pobres e assalariadas são pretas ou pardas em sua maioria. Falha que não se pode relativizar, pois a raça é o elemento crucial para se compreender as desigualdades no país.
Não enfatizar o elemento racial ao tratar sobre as desigualdades no Brasil, não pode ser considerado um trabalho mal feito, é mais grave que isso, é um trabalho não feito. Dito isso, o que deve ser destacado da pesquisa é que pessoas negras pagam proporcionalmente mais tributos, colocando luz sobre a relação entre racismo e tributação. Debater sobre tributação e desigualdades sem considerar o aspecto racial é uma espécie de miopia ou daltonismo tributário.
Diante desse cenário, uma medida que poderia mitigar esse quadro de iniquidade racial na tributação é a implementação do imposto sobre grandes fortunas, cuja previsão constitucional data do ano de 1988. No entanto, a aludida proposta não foi aprovada em votação na Câmara dos Deputados. A recusa dos parlamentares em regulamentar o imposto foi noticiada pelos diversos meios de comunicação, entretanto, sem a ênfase que o tema merece, especialmente por ser um mecanismo de promoção de justiça tributária, mas também de promoção de igualdade racial.
Dados recentes dão conta de que embora as pessoas negras representem mais da metade da população brasileira, estas são apenas 15% do 1% mais rico do país. Dessa maneira, instituir o imposto sobre grandes fortunas não apenas realizaria o desejo do constituinte originário, de promover justiça tributária, como, também, contribuiria com a diminuição das desigualdades raciais no país, o que é, inclusive, um dos objetivos constitucionais da República Federativa.
As escolhas feitas pelo Estado no campo tributário não definem apenas o método de pagamento das despesas governamentais, deve, também, ser vista como um instrumento por meio do qual os governos põem em prática sua visão de Justiça. Por meio da tributação pode ser definido quem come, quem estuda, quem tem acesso ao lazer e aos demais direitos fundamentais, inclusive, quem vai viver ou morrer. Ocorre que, não se trata aqui de conceder privilégios tributários a pessoas negras, como querem dizer alguns, o que se exige é simplesmente o cumprimento do princípio constitucional da igualdade.
Infelizmente, o cenário político atual não demonstra indícios de que haverá uma mudança substancial, desse quadro, em um curto prazo. Perdeu-se a oportunidade de promover algum nível de equidade racial com a Reforma Tributária. É preciso que os diversos setores continuem atentos e pressionando a classe política a engajar-se no caminho da justiça tributária.
*Leonardo Queiroz é advogado, mestre e doutorando em Direito pela Universidade de Brasília e Assessor Parlamentar no Senado Federal.
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